MARIANA ZYLBERKAN E ZANONE FRAISSAT
ILHABELA, SP (FOLHAPRESS) – A trilha até a cachoeira do Paquetá, na parte sul de Ilhabela, no litoral de São Paulo, tem quase nenhuma sinalização e trechos íngremes que desafiam o espírito aventureiro do turista, mas a atração se tornou popular por causa da possibilidade de fazer fotos à beira da piscina natural com borda infinita e vista panorâmica para o mar.

O caminho de cerca de 6 quilômetros começa em meio a uma rua residencial próximo à praia do Curral e era frequentado apenas por nativos até ser descoberto por influenciadores digitais e passar a ser buscado por interessados no cenário de cliques nas redes sociais.

Com a popularidade digital, a cachoeira deixou de fazer parte da lista de “secret points” de Ilhabela, mantida à boca miúda pelos moradores como uma forma de evitar o turismo predatório em pontos ainda pouco explorados. São praias desertas, piscinas naturais e cachoeiras frequentadas pelos caiçaras durante a infância.

Uma vez vencida a trilha, que se torna escorregadia em períodos de chuva e exige atenção, a disputa pela vista do último ponto de parada, no topo dos 30 metros de queda-d’água. Há outros dois poços no caminho onde parte dos frequentadores escolhe ficar seja pelo receio em escalar as pedras ou pelo ataque de borrachudos que se torna mais insistente à medida que se aproxima do topo da cachoeira.

Diante da vista panorâmica para o mar, os guias orientam os visitantes sobre as partes em que é mais seguro pisar antes de se acomodar na concha natural da pedra que permite posar para os cliques.
A Prefeitura de Ilhabela interditou essa parte da cachoeira em 2018 após duas pessoas se acidentarem e serem resgatados pelos bombeiros. Um turista morreu após cair e se afogar no local em outubro do ano passado. Por isso, a orientação é sempre contratar um guia local para fazer o passeio, e não se aventurar sem assistência.

Os guias também ensinam a fazer a pose da sereia, replicada pelas blogueiras nas redes sociais. A postura consiste em deitar com as pernas cruzadas para cima como se fossem a cauda de uma sereia com o mar ao fundo. “Vim aqui porque ele é viciado em redes sociais e queria postar fotos”, disse a biomédica Ana Ferragut Cardoso, 37, sobre o marido, o americano Jimi Owens, 38, que a acompanhou em uma tarde na cachoeira. O casal vive nos Estados Unidos e estava de férias no litoral norte paulista.

Outro ponto concorrido para tirar fotos é um cipó que faz as vezes de balanço e permite registros poéticos sobre o leito do riacho com a mata atlântica ao fundo.

As primeiras postagens sobre a cachoeira, que a tornaram conhecida nas redes sociais, foram feitas por sites independentes de turismo há cerca de dois anos. Se o conteúdo tivesse sido publicado por algum nativo de Ilhabela, a história teria sido diferente, segundo o operador de turismo Marcos Cara, 45. “Uma pessoa daqui postou foto de uma praia conhecida somente pelos locais. A pressão foi tanta que ele teve que apagar a foto”, conta.

Dono de uma agência de turismo no balneário há 22 anos, ele conta que costuma levar grupos de turistas que alugam suas lanchas a “secret points” de Ilhabela. Antes de embarcar, porém, o combinado é deixar o celular guardado e não publicar fotos nas redes sociais –e muito menos informar a localização. “Eu tenho fotos da ilha que nunca postei”, diz. “Ilhabela há dez anos era outra”, explica.

A razão para manter o mistério é evitar a presença maciça de turistas como uma forma de preservar a natureza em locais pouco conhecidos. Ao menos metade do território insular de Ilhabela ainda é de mata atlântica nativa.

Foi por meio de uma publicação na internet que o executivo de vendas Raul Souza, 30, descobriu a localização da cachoeira do Paquetá e decidiu visitá-la na companhia se seu labrador, o Chico. Atualmente, basta procurar a cachoeira em sites de busca para encontrar a localização. “É um dos destinos mais procurados de Ilhabela”, diz o visitante sobre o motivo que o fez escolher o passeio.

Outro “secret point” em Ilhabela que se tornou conhecido recentemente é o topo de uma rocha onde frequentadores praticam rapel em uma fenda com 80 metros de altura conhecido como buraco do cação. O acesso se dá pela trilha até a praia do Bonete, no lado sul da ilha.

No caso da cachoeira do Paquetá, há mais um motivo para o empenho local em mantê-la longe da lista de passeios divulgados pelos guias de turismo. Ao longo de todo o percurso até o topo da queda, existem metros de canos que transportam água para residências e pousadas próximas.

Além do risco de quebrar os canos, e comprometer o abastecimento, principalmente, dos endereços que recebem os turistas, a presença constante de pessoas na cachoeira aumenta o risco de contaminação da água que chega às torneiras sem tratamento. Esse tipo de coleta de água sem autorização dos órgãos públicos é considerado ilegal, e os adeptos podem responder por crime ambiental.