SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Naquela manhã de quarta-feira, pessoas cruzavam o saguão das duas estações ferroviárias existentes em Guararapes sem se darem conta do que um dia elas representaram não somente para a cidade, mas para o sistema ferroviário brasileiro.

Com o telhado de uma delas parcialmente destruído por um incêndio em janeiro do ano passado, o local simbolizava ainda mais o abandono ferroviário naquele trecho da extinta Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, por onde trafegava o Trem da Morte.

O lendário trem permitia, ao chegar a Corumbá, a ligação com Puerto Quijarro, na Bolívia, de onde partia o verdadeiro Trem da Morte, que vai até Santa Cruz de la Sierra, maior cidade boliviana (1,5 milhão de habitantes), e que ganhou esse nome devido ao número de acidentes e também por ser no passado rota para o transporte de doentes.

Percorremos, por rodovia, os 1.272 quilômetros entre Bauru e Corumbá e em 24 estações visitadas encontramos destruição e histórias de desolação de ex-maquinistas e antigos usuários das ferrovias.

Das 122 estações erguidas entre as cidades, ao menos 80 foram demolidas ou estão em processo avançado de deterioração, abandonadas ou fechadas, sem uso algum. A maior parte delas está sob responsabilidade do governo federal.

A história da ferrovia em Guararapes não é única, mas é uma das poucas localidades que abrigam duas estações ferroviárias juntas —no caso, uma de frente para a outra. Também no interior paulista, Altinópolis é outro exemplo.

A primeira delas foi erguida em 1929, enquanto a segunda é de 1949.

Com isso, os problemas existem em dobro também. Além do incêndio que atingiu a estação mais nova, o local estava com muito lixo, pichações e vagões abandonados —enferrujados e amassados.

Pneus armazenados no local contribuíram com o fogo, relataram vizinhos. No chão, garrafas de plástico, papéis e embalagens de ovos e de leite se misturavam com cinzas.

Guararapes tinha forte movimentação ferroviária. Enquanto muitas das antigas estações tinham apenas uma bilheteria, na cidade a mais nova tinha três guichês. Após o fechamento do local, o cômodo que abrigava a antiga bilheteria chegou a ser utilizado por atividades culturais.

Como outras cidades brasileiras, ela se desenvolveu às margens dos trilhos, tanto que, em 1929, comemorava ainda o primeiro aniversário do então povoado. Hoje, tem 33 mil habitantes.

Sem os passageiros do passado, o local é usado, além dos pedestres, por ciclistas que cruzam os trilhos (apesar de uma placa indicar a proibição) e serve de moradia para pombos.

Na praça em frente à estação, um detalhe lembra os áureos tempos ferroviários. Em meio aos cerca de 20 bancos patrocinados por empresas, a inscrição em um deles chama a atenção: “Oferta dos funcionários NOB-Guararapes”.

O relato do estado da estação ferroviária de Coroados faz parte de uma série sobre a extinta Noroeste do Brasil.

Se quiser conferir o estado geral das estações que pertenceram à ferrovia, contamos essa história aqui.

Fonte: MSN