SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Funcionários do Ministério do Meio Ambiente do governo Jair Bolsonaro (PL) relataram um ambiente de “trabalho tóxico e hostil” na área de comunicação, que era comandada por David Boutsiavaras, nomeado recentemente pelo ex-ministro e atual deputado federal Ricardo Salles (PL-SP) para trabalhar em seu gabinete.

Um dos deputados mais votado na eleição do ano passado em São Paulo, Salles pretende ser candidato a prefeito de São Paulo em 2024.

Após sete meses de trabalho e 33 oitivas, além de depoimento do próprio Boutsiavaras, houve recomendação por parte de um dos membros da comissão para que ele fosse destituído do cargo, o que foi efetuado pela atual ministra, Marina Silva, na sexta-feira (10). A punição é uma espécie de demissão por motivo doloso, mais grave do que uma exoneração, e fica no currículo do servidor. Outros dois membros sugeriram uma advertência.

Como mostrou a revista IstoÉ, Boutsiavaras foi alvo de denúncias de assédios moral e sexual, que teriam acontecido especialmente entre setembro de 2020 e julho de 2021, quando foi chefe da comunicação durante a gestão Salles, mas também entre julho de 2021 e junho de 2022, na administração Joaquim Pereira Leite.

Essas denúncias foram contestadas por ele e descartadas pela comissão em seu relatório final, sob o argumento de falta de materialidade. O Painel teve acesso ao documento por meio da Lei de Acesso à Informação.

Em seus relatos, os trabalhadores descrevem crises de choro, mal-estar e até mesmo vômito na área de comunicação do ministério, relacionados ao clima de tensão.

As acusações acatadas pela comissão contra Boutsiavaras envolvem demandas fora de horário de expediente, brigas públicas com subordinados que repassaram telefonemas a ele e episódios em que teria jogado um bloquinho e pedaços de papel no rosto e no teclado de um funcionário e teria se referido a um subordinado como “lesma” em um grupo de WhatsApp.

Funcionários relatam como episódio marcante o caso de uma colega que recebeu ordem ríspida de Boutsiavaras para voltar ao trabalho e editar um vídeo quando já estava na rodoviária, numa sexta-feira à noite. Depois, eles perceberam que o vídeo foi publicado apenas na segunda-feira e que, portanto, a ordem havia sido desnecessária. Ele disse à comissão que tinha a intenção de publicar o vídeo no dia, mas que não teve resposta do ministro.

“O depoente, ao ser perguntado sobre de que forma o acusado o demandava, afirmou que, quando as demandas não eram enviadas por WhatsApp, ele [Boutsiavaras] preenchia um bloquinho de notas e jogava por cima da mesa. Solicitado pelo presidente da comissão maiores esclarecimentos sobre esse “jogar”, o depoente simulou o fato, bem como destacou que, na maioria das vezes, o bloquinho caía no seu teclado ou em cima dele, como no seu rosto, por exemplo”, diz um dos depoimentos que constam do relatório final, alguns deles destacando que a atitude não tinha tom de brincadeira, mas era uma cobrança séria. Boutsiavaras disse à comissão que não se recorda de ter tomado tais atitudes.

Sobre ter se referido a um funcionário como lesma em um grupo, ele disse que o fez por meio de um “emoji” e que pediu desculpas ao alvo da ofensa.

Em nota, os advogados de Boutsiavaras afirmam que foi afastada “toda e qualquer acusação de assédio moral ou sexual” pela comissão, restando apenas as acusações acerca da “falta de urbanidade”.

Eles também dizem que fizeram um pedido de reconsideração que ainda está pendente, e que a transformação da exoneração em destituição pode ser revertida. Eles dizem considerar a penalidade desproporcional e desarrazoada.

Salles disse ao Painel que vai analisar o conteúdo do processo, que afirma desconhecer. Ele diz que nunca presenciou nenhuma conduta inadequada na comunicação da pasta.

Joaquim Leite não retornou contato da Folha de S.Paulo.