SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O ex-presidente da Guatemala Otto Pérez Molina foi condenado nesta quarta-feira (7) a 16 anos de prisão no julgamento de uma ação que o acusava de corrupção. As denúncias levaram à renúncia do político e de sua então vice, Roxana Baldetti, em 2015 -ela recebeu a mesma pena.
Pérez Molina estava preso, aguardando o veredicto, havia sete anos. Ele e Baldetti foram considerados culpados pelos crimes de associação criminosa e fraude, tendo sido absolvidos da acusação de enriquecimento ilícito.

O militar reformado, hoje com 72 anos, assumiu a Presidência em 2012 com o combate à criminalidade como principal bandeira, apoiado em uma plataforma conservadora e populista. Ele se viu forçado a renunciar faltando quatro meses para o fim de seu mandato, dizendo que sairia para “preservar a institucionalidade da Presidência” enquanto respondia ao processo -o Congresso já havia retirado sua imunidade.

Pérez Molina e Baldetti eram apontados pela Justiça como integrantes de uma rede chamada de “La Línea”, na qual empresários pagavam propina para importar produtos sem pagar impostos. O caso veio à tona graças a uma investigação realizada pela Cicig (Comissão Internacional contra a Impunidade na Guatemala), órgão criado em parceria com a ONU em 2007, que atua sob fiscalização da Procuradoria.

As fraudes, segundo a acusação, teriam desviado até US$ 3,5 milhões, parte deles direcionados aos políticos -mas mais de 20 pessoas também estariam envolvidas no esquema.

“Tudo o que resta é recorrer”, disse nesta quarta Pérez Molina, em um intervalo do julgamento, acrescentando que se sentiu enganado porque a condenação foi feita “sem um fragmento de prova”.

O diretor do braço local da Transparência Internacional, Edie Cux, por sua vez, classificou o caso de paradigmático. “É um divisor de águas na Guatemala, importante para que de alguma forma a população tenha justiça, não veja impunidade”, disse à agência AFP.

José Martínez, secretário-executivo da ONG Aliança por Reformas, também celebrou o desfecho, dizendo se tratar de “uma vitória para quem saiu às ruas em repúdio contra a corrupção em 2015 e nos anos seguintes”.

Nos últimos sete anos, porém, o caso foi repleto de vaivéns. O responsável pelo início da investigação, que chefiou um braço do Ministério Público, acabou tendo que se exilar nos EUA depois de ser afastado pela procuradora-geral do país, Consuelo Porras.

O líder da Cicig, o colombiano Iván Velásquez, hoje ministro da Defesa do governo de Gustavo Petro, também acabou expulso do país em 2018 depois de tentar abrir apurações que envolveriam o então presidente Jimmy Morales e liderar operações que prenderam dezenas de políticos e empresários. A comissão ajudou a desmantelar 70 estruturas de corrupção e fez denúncias que geraram mais de 400 prisões.

Em 2019 Morales deixou expirar o mandato que autorizava o funcionamento da comissão, e no ano passado investigadores guatemaltecos começaram a mirar juízes, promotores e jornalistas que teriam colaborado com as operações do órgão -muitos deles também deixaram o país.

Desde então, vários dos envolvidos em casos de corrupção investigados pela Cicig foram libertados, com condenações baseadas nos trabalhos da comissão sendo anuladas.

A Guatemala é liderada hoje pelo conservador Alejandro Giammatei, sob o qual o avanço contra a Justiça tem se tornado ainda mais contundente. Além de expulsar completamente a Cicig, o presidente iniciou um processo de demissão de vários promotores e juízes que atuavam em casos de corrupção.

A gestão cada vez mais autoritária, com avanços sobre as instituições, tem chamado a atenção de organismos internacionais. Em junho, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos acrescentou a Guatemala à lista de países que cometem graves violações aos direitos humanos, ao lado de Cuba, Venezuela e Nicarágua.

No caso recente de maior repercussão, o jornalista José Rúben Zamora foi preso, e as instalações do jornal do qual ele é fundador, El Periódico, sofreram um processo de busca e apreensão.