MADRI, ESPANHA (FOLHAPRESS) – A partir desta quarta-feira (30), o pão francês está no mesmo nível do bumba-meu-boi maranhense, do frevo recifense e das rodas de capoeira. Mas não se trata do pãozinho comprado em qualquer padaria do Brasil, e sim da baguete feita na França –aquele pão comprido no passado chamado de bengala.

Pois a baguete francesa entrou na lista do Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade, cuja edição de 2022 foi divulgada nesta quarta pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).

A relação existe desde 2008 e, nesses 15 anos, a entidade elegeu cerca de 600 manifestações culturais pelo mundo, a exemplo das já citadas do Brasil e outras como a arte dos contadores de histórias turcos (em 2008), o fado português (em 2011) ou os três alfabetos em uso atualmente na Geórgia (em 2016).

No caso da baguete francesa, a lista incluiu não o pão em si, mas o fazer artesanal e a cultura que envolve o produto. Na justificativa para a inclusão, a Unesco anotou: “O processo de produção tradicional envolve pesar os ingredientes, misturar, amassar, fermentar, dividir, relaxar, moldar manualmente, segunda fermentação, marcar a massa com cortes rasos (assinatura do padeiro) e assar. Ao contrário de outros pães, a baguete é feita com apenas quatro ingredientes (farinha, água, sal e fermento), dos quais cada padeiro obtém um produto único”.

Em relação à cultura das baguetes, o texto lembra que “elas também geram modos de consumo e práticas sociais que as diferenciam de outros tipos de pão, como visitas diárias a padarias para comprar os pães e expositores específicos para combinar com sua forma longa. A baguete é consumida em diversos contextos, inclusive durante as refeições em família, em restaurantes, cantinas de trabalho e escolas”.

Segundo diferentes fontes, de 6 bilhões a 10 bilhões de baguetes são consumidas a cada ano na França –o que significa que, todo dia, os franceses comem entre 16 milhões e 27 milhões de unidades. Para um país com 67 milhões de habitantes, isso dá cerca de uma baguete por família todos os dias.

Mas a cultura vai mais longe. Em praticamente todos os filmes de François Truffaut (1932-1984), que retratou como ninguém a vida cotidiana do país, é possível ver um personagem andando com uma baguete embaixo do sovaco ou carregando um saco pardo de compras com uma delas querendo cair.

Quando a França inscreveu a bengala para tentar entrar na lista da Unesco, em março do ano passado, o presidente da associação francesa dos padeiros, Dominique Anract, disse à agência de notícias Reuters: “A primeira incumbência que damos a uma criança é mandá-la comprar uma baguete na padaria”.

Dá até a impressão que a baguete é uma cultura de muitos séculos na França, como os queijos e os vinhos, mas nem tanto. A receita foi criada no século 19, e seu nome só foi oficializado em 1920. O padrão escolhido, de 250 gramas e 80 centímetros, caiu no gosto popular em meados do século 20.

“A baguete é farinha, água, sal, fermento -e o know-how, do artesão”, escreveu nesta quarta o presidente dos padeiros. Já a padeira parisiense Priscilla Hayertz resumiu à agência AFP: “É básico, mas chega a todas as classes sociais, seja você rico ou pobre. Não importa, todo mundo come baguetes”.