Enquanto o mundo luta para enfrentar a inflação, os preços do petróleo parecem não arrefecer. Em oito de março deste ano, há pouco mais de um mês, o barril do tipo Brent encerrou o dia em US$ 127,98 — maior alta em 14 anos —, e desde então tem oscilado mais próximo da casa dos US$ 120. No entanto, especialistas ouvidos pelo CNN Brasil Business dizem que a commodity pode chegar aos US$ 130, a depender da conjuntura internacional.

A indefinição da guerra na Ucrânia, a aplicação de sanções ao petróleo russo, problemas na cadeia de suprimentos e o mercado com movimentos de risk-off (aversão ao risco dos principais investidores) são fatores que englobam um cenário de incertezas e contribuem para a alta dos preços.

Para o analista de commodities João Lorenzi, o preço do petróleo não deve voltar a patamares vistos em janeiro deste ano, cotados próximos a US$ 80, pelo menos até agosto. “O mercado está ruim, e a expectativa para o preço por barril é mais para ele subir do que para ele descer. A partir do terceiro trimestre, as coisas vão ficar bem difíceis”, destacou.

Um dos principais motivos listados para a alta do petróleo neste período é a temporada de “driving season” nos Estados Unidos. O verão no país tem início nesta época, que também é marcada pelas férias escolares e universitárias. Esses fatores contribuem para o aumento de viagens dos americanos e, consequentemente, pelo crescimento da demanda dos combustíveis, que afeta o preço do petróleo.

Além disso, com a chegada do verão,vem também a temporada de furacões nos EUA. Conforme explicou Eberaldo de Almeida Neto, presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), paralisações na produção da commodity em razão de riscos de desastres naturais tendem a ser mais recorrentes.

“Começa o verão no hemisfério norte e com ele a temporada de furacão. Antes já ocorreram paralisações por conta desse problema, quando ainda nem estávamos no período. Nos EUA, já chegamos a perder mais de 3 milhões de barris por dia em razão de furacões, e nem chegamos na temporada de furacões. Esse é um risco que todos consideram”, pontuou.

Cenário de alta

João Lorenzi destaca a demanda mais forte, decorrente de um período de mais viagens de carro e consumo de combustível nos Estados Unidos, como um propulsor na disparada pelo petróleo. O analista também afirma que novas sanções à Rússia devido à guerra no Leste Europeu, como um bloqueio definitivo do petróleo russo, poderia alavancar a subida dos combustíveis.

“Uma coisa é termos capacidade de voltar com óleo no mercado, mas não sabemos o quanto dessa capacidade estará disponível”, salientou Lorenzi.

De acordo com Eberaldo de Almeida Neto, quando os países ocidentais aplicaram sanções ao petróleo russo, criou-se “uma perturbação” na oferta, pois ela ficou mais restrita ainda em relação à demanda.

“O mercado está curto em petróleo, com os estoques caindo consistentemente já há algum tempo. Estamos em uma situação de limite. Quando você está no limite, a massa de manobra é muito pequena, e a volatilidade é muito grande”, ressaltou.

A falta de petróleo no mercado reflete diretamente o preço da commoditie, ao comparar os fechamentos diários. Em 3 de janeiro de 2022 o barril do Brent estava US$ 78. Pouco mais de um mês depois, em 28 de fevereiro, o preço do barril fechou a US$ 100,99, passando pela primeira vez em anos o patamar dos US$ 100. Nesta segunda-feira (13), o Brent encerrou o dia cotado em US$ 122,27. Veja o gráfico abaixo:

Além dos efeitos da guerra na Ucrânia e do início do verão americano, o economista Roberto Attuch, CEO da OhmResearch, enfatizou

Como reduzir o preço?

Para Eberaldo de Almeida Neto, presidente do IBP, a única chance de um cenário de queda no preço do petróleo é em caso de diminuição da demanda. “Por meio da oferta a curto prazo, não será possível. Só teremos um preço mais baixo caso a demanda seja menor”, afirmou.

O economista Roberto Attuch ressaltou que o único país com capacidade de aumentar a produção de petróleo e mexer com a cotação atual do barril é a Arábia Saudita – um dos três maiores produtores da commoditie no mundo, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo (ANP) de 2021.

Na terça-feira (14), a Casa Branca informou que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, visitará a Arábia Saudita nos dias 15 e 16 de julho, onde se encontrará com o rei saudita Salman e o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman.

“Vamos ter que esperar para ver se o Biden conseguirá algo em sua visita. Eles devem abordar a conjuntura do petróleo atual, mas resta saber se a conversa vai chegar em algum lugar”, afirmou Attuch.

Já João Lorenzi acredita que o preço só cairá em um cenário temido pelos investidores: recessão.

“As cotações só vão cair se o mundo entrar em recessão antes do esperado. Esse é o grande risco, pois um acordo de produção não deve mudar neste momento, é algo feito há pouco tempo”, disse Lorenzi.

Combustíveis no Brasil

Com a expectativa sobre o cenário de alta do petróleo mais forte que um cenário de queda, os analistas chamam a atenção para a corrosão dos efeitos do projeto de lei que estabelece o teto de 17% sobre os combustíveis, cujo objetivo é controlar o preço nas bombas. O Senado aprovou o PLP 18 com 65 votos favoráveis ao texto-base, contra 12 votos contrários e zero abstenções. O texto agora retorna para a Câmara dos Deputados.

A medida tem o objetivo de aliviar a alta de preço dos combustíveis nos postos ao consumidor brasileiro. Em prática, a ação resultará em uma arrecadação menor por parte das unidades federativas, que serão compensadas pela União. No entanto, em razão da volatilidade do exterior, especialistas acreditam que é provável que o projeto não tenha o efeito desejado.

“Acredito que até possa haver diminuição no preço da gasolina, que não dependemos tanto assim dos outros países. Mas devido à importação do diesel, é impensável que o preço caia”, apontou João Lorenzi.

O analista ressaltou que não acredita que faltará diesel globalmente, exceto se um furacão entre no radar da costa americana, mais precisamente no Golfo do México, e isso altere a oferta no mundo.

Eberaldo de Almeida Neto destacou que o cenário envolvendo o diesel é mais preocupante que o do petróleo em si, e que a probabilidade de haver falta do produto em algumas regiões do Brasil é real.

“O que temos visto nos últimos meses é uma redução no estoque. Aqui no Brasil temos estoques operacionais, mas nos EUA eles têm um estoque próprio, de segurança. O Brasil pode até pensar em fazer, mas não seria nada de curto prazo”, comentou.

“Se os furacões vierem mais fortes por conta de movimentos climáticos atípicos, como vem ocorrendo nos últimos anos, com casos de chuva recorde e cada vez mais furacões…isso vai gerar uma percepção de risco e uma volatilidade maior”, acrescentou.

Alta dos juros

A inflação no mundo está levando os bancos centrais a elevarem suas taxas básicas de juros, com o objetivo de desaquecer a economia e, assim, trazer a inflação mais próxima das metas.

Nesta quarta-feira (15), o Banco Central do Brasil e o Federal Reserve (Fed) vão definir os juros em mais uma tentativa de conter a alta de preços, na data que ficou conhecida pelos investidores como “super-quarta”. Enquanto isso, os mercados temem aumentos mais agressivos que levem os EUA, a maior economia do mundo, a entrar em recessão.

“A impressão que eu tenho é que os bancos centrais estão tentando apagar um incêndio com uma ‘pistolinha’ de água”, afirmou Roberto Attuch.

A Selic, taxa básica de juros no Brasil, começou a subir em março de 2021, quando estava em na mínima histórica de 2% ao ano. A economia brasileira, então, deu a largada no processo de aumento dos juros, acompanhada meses depois pelas entidades monetárias de outras partes do mundo.

Atualmente, a Selic está em 12,75% ao ano, enquanto os juros americanos estão em 1% ao ano, no maior nível em quatro décadas. O quadro, no entanto, é diferente, pois os EUA começaram a elevar os juros um ano depois, em março deste ano, com a secretária do Tesouro, Janet Yellen, admitindo que errou ao subestimar a inflação que começava a se manifestar com força há alguns meses.

A expectativa tanto nos juros do Brasil quanto no dos Estados Unidos é de alta de 0,5 ponto percentual, segundo especialistas consultados pelo CNN Brasil Business, uma aposta que foi reforçada com indicadores econômicos divulgados entre maio e junho.

Fonte: CNN Brasil