Putin

Crédito, Reuters

Putin pode escalar a guerra com armas nucleares? Essa é a pergunta que o mundo inteiro se faz

  • Author, Steve Rosenberg
  • Role, BBC News
  • Há 3 horas

A guerra da Ucrânia vai se tornar um guerra nuclear?

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, não descarta que isso possa acontecer.

“Eu me preocupo com Putin usando armas nucleares táticas”, disse o presidente americano nesta semana. Ele acredita que o perigo é “real”.

Não sei se o presidente Biden lê a revista russa Profile – mas ela serve para entender as raízes dessa preocupação.

Na semana passada, o periódico publicou um artigo do proeminente especialista em política externa e de defesa da Rússia, Sergei Karaganov, que também é presidente honorário do Presidium do Conselho de Política Externa e de Defesa. Karaganov é próximo a muitos generais poderosos da Rússia.

Para ele, “para frear o Ocidente, a Rússia terá que tornar a discussão sobre armas um argumento convincente novamente, diminuindo o limite para o uso dessas armas”.

“O inimigo deve saber que estamos prontos para desferir um ataque preventivo em retaliação a todos os seus atos de agressão atuais e passados, a fim de evitar uma guerra termonuclear global. Mas e se eles não recuarem? Nesse caso, teremos que atingir um monte de alvos em vários países para trazer à razão aqueles que perderam a cabeça”, escreveu Karaganov.

Desde o ano passado, o mundo se acostumou com Moscou falando novamente sobre armas nucleares.

E o presidente Putin confirmou que a Rússia já estacionou um primeiro lote de armas nucleares táticas na Bielorrússia.

Segundo ele, o objetivo do movimento é lembrar qualquer um que “pensa em nos infligir uma derrota estratégica”.

Mas e discutir as vantagens de um ataque nuclear preventivo no Ocidente? Esse é um nível totalmente novo.

Claramente, nem todos na Rússia concordam com essa ideia.

Uma edição recente do jornal econômico Kommersant veiculou um artigo intitulado “A guerra nuclear é uma maneira ruim de resolver problemas”.

O texto sugere que o debate interno na Rússia sobre o uso de armas nucleares na guerra na Ucrânia já começou.

Soldado em área com escombros

Áreas da Ucrânia foram recentemente retomadas pelas forças do país

Consequências imprevistas

Escrito por outro grupo de especialistas em política externa e de defesa de Moscou, o artigo do Kommersant explica por que eles acreditam que Sergei Karaganov estava “perigosamente errado.”

“A ideia de que o uso de armas nucleares pode interromper a escalada e resolver problemas estratégicos que os meios militares convencionais falharam é extremamente duvidosa e, provavelmente, equivocada”, escrevem Alexei Arbatov, Konstantin Bogdanov e Dmitry Stefanovich, membros do Centro de Segurança Internacional — parte de um think tank da Academia Russa de Ciências.

“Na história moderna, há muitos exemplos de operações militares que levaram a consequências imprevistas. Mas elas ocorreram sem o uso de armas nucleares. Um ataque nuclear elevaria o conflito a um nível totalmente novo de imprevisibilidade e aumentaria muitas vezes as apostas do confronto”, escreveram.

“As ruínas radioativas de uma ‘roleta nuclear’ provavelmente são a pior base para um futuro brilhante. Os fãs de ideias sensacionalistas e jogos de azar perigosos devem se lembrar disso.”

O que nos leva a outra pergunta que temos feito desde o início da guerra da Rússia na Ucrânia: o que está acontecendo?

É possível que a proposta de Karaganov para um ataque nuclear preventivo tenha sido tão chocante que outros acadêmicos russos acharam que não podiam ficar calados.

Em caso afirmativo, isso mostra que, embora o cenário da mídia russa seja agora fortemente controlado pelo Estado, mesmo dentro dos limites atuais, ainda há espaço em algumas plataformas para debate e discussão sobre determinados tópicos. Especialmente tópicos cruciais como a guerra nuclear.

Ou pode ser que todo esse debate seja planejado para chamar a atenção do Ocidente, para fazer o presidente Putin parecer um “bom policial”.

Afinal, o próprio líder do Kremlin não pediu um ataque nuclear preventivo contra o Ocidente. E assim — continua o argumento — é melhor sentar e fazer as pazes com ele, antes que os generais linha-dura pressionem o botão nuclear.

Uma coisa é certa: com a retórica anti-Ocidente crescendo na Rússia e com a contra-ofensiva do Exército ucraniano em andamento, a questão nuclear não vai desaparecer do debate tão cedo.

Fonte: BBC