Pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) relataram em artigo científico o primeiro caso no Brasil de meningoencefalite causada pelo fungo Penicillium chrysogenum.

O fungo raramente é apontado como causa de doenças em humanos. No entanto, provocou infecção grave no cérebro e meninges de uma paciente no município do Rio de Janeiro, que levou à morte. O relato foi publicado no periódico científico International Journal of Infectious Diseases.

O caso foi acompanhado no Hospital Naval Marcílio Dias, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Uma adolescente de 14 anos foi admitida no centro médico com dores de cabeça, fotofobia e vômito. De acordo com os exames, a jovem não apresentava comorbidades e aparentava possuir plena capacidade de reagir contra agentes infecciosos.

A presença do fungo foi observada em análises do líquido cefalorraquidiano, fluido que envolve o cérebro e a medula espinhal. As amostras foram enviadas para identificação taxonômica mais detalhada no Laboratório de Taxonomia, Bioquímica e Bioprospecção de Fungos do IOC/Fiocruz. A partir de metodologias que envolvem a caracterização taxonômica, e técnicas moleculares, foi confirmado que o fungo encontrado pertencia à espécie Penicillium chrysogenum.

“Os quadros de meningoencefalite são comumente associados a infecções provocadas por bactérias ou por fungos do gênero Cryptococcus. Foi um espanto identificar que este caso estava relacionado ao Penicillium, e de uma espécie que ainda não tinha sido descrita no país como causadora dessa doença”, destaca Manoel Marques Evangelista de Oliveira, coordenador do estudo, em comunicado.

Com a confirmação, os médicos do Marcílio Dias iniciaram tratamento da jovem com duas classes de medicamentos antifúngicos. Apesar dos esforços, a paciente morreu devido ao choque séptico e neurogênico.

“A gravidade desse caso nos preocupa por ter ocorrido principalmente em uma paciente imunocompetente, pois pode significar que o P. chrysogenum tem um perfil de escape da resposta imunológica. O caso poderia ter tido uma evolução ainda mais rápida e complicada em pacientes com a imunidade comprometida, como pessoas com HIV/Aids ou em tratamento da Covid-19”, explica Manoel.

Para o pesquisador, o achado demonstra a necessidade de uma identificação rápida e precisa de agentes causadores de doença e a importância de ampliar os estudos acerca de fungos.

“O nosso artigo serve de alerta para médicos considerarem mais constantemente os fungos em seus diagnósticos, como foi feito pelo Hospital Naval Marcílio Dias. Assim como vírus e bactérias, os fungos podem provocar diversas doenças. Porém, como não são muito lembrados, vários casos são tratados tardiamente ou passam despercebidos”, afirma.

Segundo os pesquisadores, a forma como a paciente foi infectada pelo P. chrysogenum não ficou evidente. Embora o fungo esteja amplamente distribuindo no ambiente, é mais comum encontra-lo em solos onde há matéria em decomposição, passagem de esgotos e obras.

Novos casos de infecções fúngicas

A publicação também destaca um aumento recente na incidência de infecções fúngicas no sistema nervoso central humano. Entre as principais síndromes desencadeadas pelo contágio estão meningite, encefalite e elevação da pressão intracraniana.

“Esse aumento está relacionado ao crescimento, nas últimas duas décadas, do número de pessoas imunossuprimidas, ou seja, com baixa imunidade. Os motivos são diversos: pessoas que vivem com HIV/Aids, uso indiscriminado de medicamentos, casos de depressão e, mais recentemente, a Covid-19. Esses indivíduos estão propícios a contraírem infecções por fungos”, diz o pesquisador.

A maioria das ocorrências está relacionada a espécies do gênero Cryptococcus, que provocam meningite. A infecção geralmente ocorre pela inalação de esporos em poeiras de solos contaminados com excrementos de pombos.

“Os fungos que causam a criptococose estão amplamente difundidos no mundo. Mas também há outro fator que contribui para o grande número de casos relatados: a facilidade no diagnóstico. Diferentemente da maioria das infecções fúngicas, há testes rápidos para identificação das espécies de Cryptococcus, que permite a realização de um diagnóstico mais rápido e sem a necessidade de acionar um laboratório de micologia”, diz.

Para o pesquisador, o número pode ser ainda maior. “Casos podem estar apenas sendo subnotificados, pois há carência de profissionais especializados na área. É importante que haja troca constante entre laboratórios de micologia e hospitais”, avalia.

(Com informações da Comunicação do Instituto Oswaldo Cruz)

Fonte: CNN Brasil