O circuito de museus e monumentos é longo e inspira reflexões sobre o quanto a causa racial importa. Neste domingo (12), passamos pela rua Black Lives Matter (vidas negras importam, em tradução livre), localizada em frente à Casa Branca, sede do governo americano; fomos ao Memorial Martin Luther King, também na área central da cidade; estivemos no Memorial de Abraham Lincoln; e ao final, no Museu Nacional de História e Cultura Afro-Americana – outro lugar privilegiado, na avenida National Mall, também conhecida como “o jardim da América”, que reúne vários lugares sobre a história do país.

Todos lugares citados neste texto oferecem entrada gratuita aos visitantes. Não é uma simples localização. O que tem importância para um Estado precisa estar aos olhos ou trazido para perto de quem tem poder de decisão e acessível ao público. Estes museus e monumentos contam história. Assim, a memória fica marcada por fundamentos que combatem covardias, segregações e injustiças, para que diminuam ou deixem de acontecer. Por isso, não é surpresa observar que há pontos antigos e inaugurados muito recentemente para falar da luta racial, na capital americana. Falar da questão racial é uma constância por aqui.

Após a morte de George Floyd e de novos embates de manifestantes com forças policiais, a rua em frente à Casa Branca passou a ser oficialmente chamada de Vidas Negras Importam. As janelas da sede do governo americano, de ministérios ou outros prédios públicos dão de cara com o que não pode ser esquecido. A inauguração ocorreu em meados de 2020 mas, além de ser comemorada, também levantou críticas de ativistas que viram uma forma de “distração” para os reais problemas. Isso reforça que a proximidade com o Poder é, mesmo que muito importante, apenas parte da complexa luta contra a segregação racial.

Perto dali, ao entrarmos no memorial de Luther King, o guia observa que a gigante estátua do ativista negro está virada diretamente para o Memorial Thomas Jefferson, autor da Declaração de Independência dos Estados Unidos. Enquanto o ex-presidente americano foi importante para o avanço dos direitos humanos, King foi um ícone na luta dos direitos civis. “King está olhando na direção de Thomas Jefferson de propósito. Jefferson escreveu a declaração de independência que diz ‘all men are created equal’. Ou seja, todos os homens são iguais. Mas foi Martin Luther King que deu a vida para realizar esse sonho nos EUA”, ressalta o guia Vinícius Portugal, um brasileiro que trabalha como advogado do governo americano e voluntariamente acompanha os passeios de turistas na capital.

A estátua de King não é das mais antigas da cidade, existe desde 2011. Naquela época, o presidente da Fundação em Memória de Martin Luther King ressaltou que tratava-se do “primeiro monumento do National Mall que é dedicado a um homem de cor, de esperança e paz”.

O memorial é dividido em um bloco de pedra enorme quebrado ao meio e, em frente, outro pedaço dessa pedra como se Luther King tivesse atravessado a barreira. Ele aparece esculpido de braços cruzados. Na lateral, está escrito: “Da montanha do desespero, uma pedra da esperança”. É um dos monumentos mais contemplativos que já visitei. Fomos em seguida ao memorial de Abraham Lincoln, um dos pontos altos do dia porque estivemos no local onde Luther King falou a célebre frase “I have a dream” (eu tenho um sonho).

Museu afroamericano

Para quem tinha o sonho de entrar em um museu sobre a história dos negros americanos, isso pode ser realizado somente depois de 2016, quando houve a inauguração do Museu Nacional de História e Cultura Afro-Americana, simplesmente o único dedicado à documentação da vida história e cultura de negros.

A escolha pela dor ou triunfos da historia dos negros norte americanos também pode ser percebida aqui. No subsolo, encontram-se referências ao tráfico de negros na colonização, ao trabalho no campo, às famílias dissolvidas pela escravidão. Até chegar à eleição de Barack Obama e ao sofá de entrevistas da super Ophra Winfrey.

Já nos andares mais altos, e que representam boa parte do espaço, encontrei o oposto: música, esporte, arte, cinema e Jornalismo feitos por profissionais negros.

Telões, painéis, objetos contam mais sobre Ophra Winfrey, Michael Jordan, Beyoncè, Viola Davis, Barack Obama e tantos outros. Também sobre a vida de pessoas menos conhecidas, como Mary Ann Shadd Cary, que na década de 1850 foi a primeira afro americana a escrever e editar um jornal, Provincial Freeman, sobre abolicionismo, direito das mulheres e imigrantes negros. Outro exemplo é uma foto da sorridente cantora e dançarina Josephine Backer, de 1925. Também considerada a primeira super star negra. Não à toa, todos apelidos registrados em sua biografia remetem a cor da sua pele: Pérola Negra, Vênus Negra, Deusa Crioula.

* Basília Rodrigues viajou a convite da Embaixada dos Estados Unidos no Brasil

Fonte: CNN Brasil