Associações que representam investidores, aliadas ao IBGC, entidade de defesa à governança corporativa, e ao Instituto Ethos, publicaram uma nota de repúdio sobre a alteração da Lei das Estatais, aprovada na Câmara dos Deputados.

A mudança aprovada pelos parlamentares prevê a redução de 36 meses para 30 dias do período de quarentena exigido para que pessoas que exerceram cargos políticos ocupem postos em estatais.

A nota destaca que a Lei das Estatais blinda as companhias controladas pelo governo contra o “risco de sua captura por interesses político-partidários”.

De maneira informal, participantes das entidades que assinam a nota afirmam que a alteração na Lei pode levar as estatais a um retrocesso, fazendo com que essas empresas voltem a se tornar “cabides de empregos”.Outra crítica feita diz respeito ao prazo de aprovação da mudança da Lei pelos parlamentares, à toque de caixa, em uma noite.

A leitura feita é de que políticos estão revogando em poucas horas a construção de uma lei que foi elaborada a partir de anos de discussão, com base em parâmetros internacionais.

Ainda que os participantes admitam que a quarentena de 36 meses possa ser um período muito extenso, passível de discussão, repudiam a mudança repentina. E defendem que a quarentena de apenas 30 dias permite que qualquer político ocupe cargo nas estatais, de maneira imediata.

Assim, as decisões administrativas das empresas correm o risco de ser pautadas por questões políticas e não técnicas, comprometendo a eficiência da empresa e, consequentemente, os interesses dos investidores e até mesmo a função pública da estatal.

As organizações mencionam, inclusive, que a Lei das Estatais foi reconhecida internacionalmente, pela OCDE, o chamado “clube dos países ricos”, por ter elevado o nível de independência das empresas estatais brasileiras.

Veja abaixo a íntegra da nota:

Nota de repúdio – Alteração do artigo 17 da Lei das Estatais e do artigo 8-A Lei das Agências Reguladoras

Diante da aprovação pela Câmara dos Deputados do Projeto de Lei 2.896/2022, que altera os artigos 17, que altera os arts. 17 e 93 da Lei 13.303/2016 (Lei das Estatais) e o art. 8-A da Lei nº 9.986 (Lei das Agências Reguladoras), a Associação dos Investidores no Mercado de Capitais (Amec), a Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil, (Apimec Brasil), o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), o Instituto Brasileiro de Direito e Ética Empresarial (IBDEE), o Instituto Não Aceito Corrupção (INAC) e o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade ressaltam que:

1 – Repudiam o procedimento legislativo adotado para alterar os requisitos e vedações estabelecidos pelo artigo 17 da Lei 13.303/2016 e o artigo 8- A da Lei 9.986 para a investidura dos cargos de administradores das empresas estatais e diretores das agências reguladoras.

2 – A edição da Lei 13.303/2016, fruto de longo processo legislativo, com a interação da sociedade civil, representou avanço substancial na governança corporativa das empresas estatais federais, estaduais e municipais e na adoção de blindagem contra o risco de sua captura por interesses político-partidários, que ensejaram casos notórios de corrupção, de ineficiência de alocação de recursos públicos e de atendimento a objetivos eleitorais e privados, em detrimento dos objetivos para os quais as companhias foram criadas.

3 – O texto legislativo em vigor estabelece meios para que a seleção de candidatos à administração das estatais seja guiada por profissionalismo, qualificação técnica, ética e atendimento aos objetivos dessas empresas, fortalecendo, dessa forma, a sua integridade, governança, gestão e eficiência. A Lei das Agências Reguladoras, inspirada pela Lei 13.303, replicou os mesmos procedimentos do artigo 17.

4 – Os danos decorrentes de indevidas interferências político-partidárias prejudicam os cofres públicos e a qualidade dos serviços e produtos entregues à população. Tais interferências afetam, de forma negativa, o ambiente de negócios brasileiro, comprometendo o desenvolvimento do País e a mitigação da desigualdade social existente.

5 – No caso das sociedades de economia mista listadas em bolsa de valores, os impactos atingem investidores, prejudicando a atratividade do mercado brasileiro de capitais como importante fonte de financiamento das atividades econômicas.

6 – As normas introduzidas pelo texto de 2016 atendem a recomendações de referências nacionais e internacionais, incluindo as diretrizes de governança para empresas estatais da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O alinhamento a esses padrões é um dos passos previstos no processo de acessão do Brasil à OCDE, que já reconheceu publicamente que os conselhos de administração das estatais federais aumentaram a independência de interferências político-partidárias em função dos impedimentos estabelecidos pela Lei das Estatais.

7 – A OCDE recomendou ao Brasil ir além das conquistas já alcançadas e perseguir aprimoramentos como a (i) extensão dos requisitos e vedações para todos os comitês do conselho de administração e para o conselho fiscal, (ii) a concessão efetiva ao conselho de administração do poder de indicar e demitir o diretor-presidente das estatais, e (iii) o aperfeiçoamento das regras e procedimentos de indicação e nomeação de administradores dessas empresas.

Por fim, as organizações abaixo assinadas, representantes da sociedade civil, esperam e confiam que os órgãos externos de controle e o próprio Poder Judiciário cumpram, tempestivamente, com suas atribuições, fiscalizando e punindo os responsáveis por desvios das normas jurídicas e dos sistemas de governança das estatais e das agências reguladoras. É preciso que os integrantes dos Poderes Executivo e Legislativo atuem para preservar a Lei 13.303/16, combatendo qualquer tentativa de mudança indevida, que resulte em retrocessos.

• AMEC – Associação dos Investidores no Mercado de Capitais
• APIMEC BRASIL – Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil
• IBDEE – Instituto Brasileiro de Direito e Ética Empresarial
• IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa
• Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social
• INAC – Instituto Não Aceito Corrupção

Fonte: CNN Brasil