Há muitas formas de fugir da realidade, sendo as drogas uma delas. Todo vício, ou seja, todo excesso, trai a presença de algo que está por trás e o mantém vivo.

O que sustenta o vício? O medo de encarar a realidade, própria e coletiva.

Foge-se da realidade por sentir-se incapazes de sustentá-la.
Sem sustentar a visão da verdade, não é possível transformar o que não é bom.

Muitos param nesse primeiro estágio: não aguentam saber, enxergar e se deparar com a dura e crua realidade e escapam para um mundo fantasioso interno nutrido por uma droga, um hábito ou uma crença… Por qualquer coisa que permita se manter protegidos da visão do real percebida como horrenda.

A fuga dos fatos é indício de fraqueza emocional, pois não se consegue aguentar a emoção de ver a tragédia, mas é também sinônimo de fraqueza mental, pois não a se consegue pensar e processar, a tragédia. Cérebro e coração fogem do real e, assim, o indivíduo permanece num estado de minoridade.

É do adulto, ou seja, da pessoa madura, saber lidar com O Que É. Portanto, por trás de todo vício há uma condição infantil estruturada em torno de crenças, racionalizações e “convicções”.

O vício é uma forma de fanatismo.

Para C.G. Jung todo fanatismo é indício de insegurança interior, da presença de uma dúvida a respeito da própria coisa da qual se é fanáticos. O fanatismo é, portanto, a obsessão e o grito que calam a pergunta que não quer calar: Você tem certeza?

A verdade é que não se tem certeza de nada nessa vida. Saber viver na incerteza, saber lidar com a dúvida como ferramenta criativa para aumentar o conhecimento e a capacidade de objetividade é para mentes cultas e corações maduros.

Num país ou numa família onde cultura, educação e respeito não são valorizados e, sobretudo, praticados, o indivíduo cresce sem instrumentos para lidar com suas inseguranças e com sua própria individualidade emergente. Uma família mantida na base de crenças absolutas, como as religiosas ou políticas, comete um crime contra a própria essência de ambas as áreas da vida cultural e social humana. No lugar de libertar, prendem.

Num contexto de ausência de horizontes libertadores na direção dos quais se desenvolver, não resta ao indivíduo que se inserir nos nichos doentios do vício para encontrar neles sentido para a própria existência, ou melhor, para afogar neles a angústia pela falta de sentido de sua vida.

O sentido só se manifesta se houver as condições mentais (ou seja, culturais e educacionais) e emocionais (ou seja, estabilidade e tolerância). O único sentido existencial que faz sentido na vida de uma pessoa, o que significa que a leva adiante pelo resto de sua vida, é aquele que brotar livremente de dentro dela. Na falta das condições disso acontecer, a pessoa pega emprestado algo de fora, já pronto. Ela é obrigada a se identificar com os produtos culturais em circulação, de acordo com sua origem familiar.

Mas estes produtos nunca podem satisfazer plenamente a alma, ao contrário, eles a mantém afastada da realidade individual. Quando mais uma pessoa recheia sua cabeça de conteúdos prontos produzidos por outras pessoas em outros contextos mais ela se afasta de sua realidade pessoal e íntima, e mais se aliena de si mesma. Com a alienação cresce o desconforto interno e conforme se evitar encará-lo refugiando-se em produtos externos, mais aumenta o medo de estar consigo.

Quanto mais intenso esse desconforto interno maior a necessidade de se apegar com desespero quase a crenças e hábitos que “salvem” do abismo interior. E surgem os fanatismos e os vícios.

O post A Fuga Da Realidade apareceu primeiro em .

Fonte: Gazeta News