RECIFE, PE, E RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A duas semanas do fim da janela partidária, a deputada federal Marília Arraes (PE) intensificou as articulações para deixar o PT e pode gerar uma encruzilhada para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na corrida eleitoral de 2022.

Marília passou os últimos dias em Brasília, imersa em conversas com caciques partidários. A deputada tem negociações avançadas com o Solidariedade, mas também teve conversas com MDB e PDT.

As articulações incluem a garantia de que ela poderá ser candidata ao Senado ou ao Governo de Pernambuco, o que pode provocar uma rearrumação do quadro eleitoral do estado.

A pretensão maior de Marília Arraes é disputar o Senado. Três possibilidades estão em jogo em caso de saída do PT: lançar-se avulsa, fechar uma aliança com a pré-candidata do PSDB, Raquel Lyra, ou tentar se aliar ao PSB por meio do novo partido.
O Solidariedade é presidido pelo deputado federal Paulinho da Força (SP). O partido atenderia aos interesses de Marília porque ela pretende seguir apoiando Lula, mesmo se efetivar a saída do PT.

O espaço foi aberto no Solidariedade após a filiação do deputado federal Augusto Coutinho (PE) ao Republicanos. Ele deixou o comando da sigla no estado. Com o espaço aberto, Marília Arraes pode receber o aval de Paulinho para tocar a legenda em Pernambuco.

Caso seja selada a filiação ao Solidariedade, o partido pretende consultar o ex-presidente Lula logo em seguida. O partido tem como objetivo tentar superar a cláusula de barreira. Para isso, precisa ampliar as bancadas no Congresso Nacional.

Marília Arraes também teve conversas com integrantes da cúpula do MDB, como o presidente nacional do partido, deputado federal Baleia Rossi (SP), e com o senador Renan Calheiros (AL), aliado de Lula.

Renan mira a presidência do Senado Federal a partir de 2023 se Lula for eleito presidente. A articulação para tentar filiar Marília ao MDB pode assegurar o voto de Marília, se eleita, em prol de Renan em um possível pleito pelo comando da Casa no biênio 2023/2024.

O MDB em Pernambuco é comandado pelo deputado federal Raul Henry, ligado ao senador Jarbas Vasconcelos. Após conversar com Baleia Rossi, Marília chegou a telefonar para Henry para comunicá-lo sobre as tratativas.

Raul Henry está com dificuldades para montar as chapas proporcionais do MDB para o Legislativo em Pernambuco. Nos bastidores, especula-se uma filiação dele ao PSB para buscar a reeleição caso o cenário adverso continue na sigla emedebista.
O deputado tem prazo até segunda (21) para informar à direção do MDB se conseguiu montar a tática eleitoral para as disputas da Câmara e da Assembleia de Pernambuco.

Outro partido procurado foi o PDT. O partido tem resistências à Marília porque a deputada quer manter voto em Lula para presidente, enquanto a legenda tem o ex-ministro Ciro Gomes como pré-candidato ao Palácio do Planalto.

Atualmente aliado ao PSB em Pernambuco, o PDT só pretende desmobilizar a aliança se for para ter um candidato ao governo que peça votos para Ciro Gomes.

Integrantes dos três partidos procurados -Solidariedade, MDB e PDT- também desconfiam que a deputada Marília Arraes possa estar usando essas conversas para pressionar o PT de Pernambuco a escolhê-la como pré-candidata ao Senado.

O processo de definição do PT não se esgotou, mas o partido esticou o prazo -antes previsto para o dia 20- para 27 de março. O objetivo, segundo informações de bastidores, seria segurar Marília no PT para que ela não saia da sigla, sendo ou não candidata ao Senado.

Isso porque o PT teme pelas chapas proporcionais. O partido tem atualmente em Pernambuco dois deputados federais e três estaduais. Mesmo com a federação com PV e PC do B, há um consenso entre os petistas de que a situação ficaria complicada sem Marília no partido, seja para ela buscar a reeleição à Câmara ou redistribuindo o seu eleitorado entre aliados.

O porta a porta de Marília em outros partidos coloca Lula numa encruzilhada no palanque estadual de Pernambuco. O ex-presidente não tende a vetar a migração da deputada para o Solidariedade, pois o partido já declarou apoio à sua postulação ao Planalto.

Em paralelo, também não pode avalizar o ingresso de Marília Arraes em outro partido, ainda que seja um aliado do PT, para não provocar tensão no palanque estadual do PSB em Pernambuco. O estado é o centro de poder da legenda e, nesse cenário, Marília estaria se opondo ao partido.

O entorno de Lula foi pego de surpresa com a movimentação de Marília Arraes. Há avaliação no partido de que a deputada faz as articulações à revelia do ex-presidente Lula.

A presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, não foi consultada sobre as negociações por Marília Arraes. Gleisi não conversou com Marília nos últimos dias sobre o assunto.

A saída da petista pode significar uma perda de uma aliada considerável do ponto de vista eleitoral para Lula em Pernambuco em meio à busca pela vitória presidencial.

Entre aliados próximos há consenso de que Marília embarcou para Brasília no início da semana com a missão de negociar com outros partidos. Na terça, ela chamou assessores políticos mais próximos para ajudá-la a tomar uma decisão. A parlamentar acredita que não terá aval do PT para disputar o Senado.

Em Pernambuco, Marília faz parte de grupo oposto ao do senador Humberto Costa no PT.

Marília Arraes entrou no PT em 2016, dois anos após iniciar um processo de rompimento com o PSB. Em 2018, ela se lançou como pré-candidata ao Governo de Pernambuco, mas foi rifada do pleito pela direção nacional do PT em troca do PSB não dar apoio a Ciro Gomes.

Em 2020, o cenário foi inverso: Marília Arraes não teve o aval do PT local para disputar a Prefeitura do Recife, mas a direção nacional da legenda fez uma intervenção e bancou a sua candidatura. A petista acabou derrotada pelo primo de segundo grau, João Campos (PSB), em um segundo turno de disputa acirrada.