GUARULHOS, SP (FOLHAPRESS) – A Ucrânia tem dado cada vez mais sinais de que pretende iniciar uma contraofensiva na porção sul do território, área hoje majoritariamente controlada pela Rússia. O aviso mais recente veio neste fim de semana por meio do ministro da Defesa Oleksii Reznikov: “Temos cerca de 1 milhão de homens para defender o sul”.

A fala, em entrevista ao jornal britânico The Times, foi interpretada com ceticismo por analistas militares, mas vem na esteira de outras declarações que pedem aos residentes da região que partam dali, uma vez que contra-ataques são iminentes.

Kherson, uma das principais cidades portuárias do país, foi a primeira a cair sob o controle de Moscou desde o início do conflito, no final de fevereiro. Reznikov alegou que, com ordens do presidente Volodimir Zelenski, retomar áreas ocupadas ao redor da costa do mar Negro, vitais para a economia ucraniana, tornou-se prioridade.

“O presidente deu ordem ao chefe militar para elaborar planos e, depois disso, o Estado-Maior está fazendo sua lição de casa”, afirmou. Ele disse estar entrando em contato com homólogos de outros países para explicar o objetivo e pedir, é claro, o envio de mais armamentos.

O ceticismo de analistas militares, no entanto, sustenta-se em dois motivos principais. Primeiro, o fato de que seria incomum um dos lados da guerra vociferar reiteradamente uma ação de contraofensiva, uma vez que isso daria tempo para a reorganização dos oponentes.

“O normal seria querer que o lançamento de um contra-ataque fosse surpresa”, disse à rede BBC Jack Watling, pesquisador do think tank Royal United Services Institute. “Anunciar isso publicamente força os russos a comprometer mais recursos para conter essa ameaça.”

Outro fator que pesa se refere aos esforços que Kiev tem despendido no leste do território, na porção conhecida como Donbass, onde ataques são mais intensos. A necessidade de forças concentradas ali faz os números apresentados pelo ministro da Defesa parecerem inflados para uma contraofensiva concentrada no sul.

“Temos aproximadamente 700 mil [homens] nas Forças Armadas; adicionados a Guarda Nacional, a guarda da fronteira e a polícia, somos cerca de um milhão”, disse Rezniko ao Times.
As forças ucranianas têm, em grande parte, apoiado-se em ativistas e voluntários, alguns dos quais treinados por membros do Batalhão Azov, grupo neonazista que foi parcialmente incorporado ao Exército do país, meses antes da invasão militar ter início. São inúmeros os casos de combatentes do exterior que se ofereceram para ajudar o país –brasileiros chegaram a morrer no front.

Do lado russo, também há um desafio nesse sentido. A inteligência ucraniana, segundo relatório do Instituto para o Estudo da Guerra, um think tank baseado em Washington, afirma que Moscou tem recorrido massivamente a empresas militares privadas para aumentar o número de recrutas e compensar as perdas de pessoal na guerra.

O principal caso é o Grupo Wagner, empresa russa do tipo que o governo de Vladimir Putin nega ter conhecimento. O grupo atua na Ucrânia desde 2014, quando houve a anexação da península da Crimeia e a intensificação dos conflitos no Donbass, área de maioria étnica russa formada pelas províncias de Donetsk e Lugansk.

A inteligência ucraniana diz que o grupo tem recrutado prisioneiros russos, independentemente da natureza dos crimes que tenham cometido, e oferecido anistia de suas penas em troca do serviço militar.

O mapa do controle russo no território ucraniano permite observar uma faixa que se estende do noroeste ao sul do país. Ponto importante seria a tomada de Kharkiv, a segunda maior do país e localizada a norte do Donbass. Autoridades locais disseram que a cidade foi atingida por mísseis de Moscou nesta segunda (11), deixando três civis mortos e outros 31 feridos, incluindo duas crianças.