Imagem da barreira que existe atualmente na fronteira entre os EUA e o MéxicoDireito de imagem Getty Images/BBC
Image caption Barreira atual na fronteira entre EUA e México: Opositores dizem que nova construção proposta por Trump é desperdício de dinheiro

Um impasse sobre o financiamento do muro prometido pelo presidente Donald Trump para a fronteira dos Estados Unidos com o México resultou na mais longa paralisação já registrada no governo americano.

Uma das principais promessas de campanha de Trump, a construção ajudaria, segundo ele, a conter a imigração irregular e o tráfico de drogas vindos do vizinho do sul – mas, não só divide opiniões como enfrenta desafios, como a falta de recursos.

O presidente argumenta que US$ 5,7 bilhões (aproximadamente R$ 21,4 bilhões) são necessários e que o muro permitiria conter uma “crise humanitária e de segurança” na fronteira sul.

Ele se recusa a aprovar parte do orçamento federal porque este não inclui o montante para a obra e, com isso, trava uma queda de braço com os democratas – que atualmente controlam a Câmara dos Representantes (a Câmara dos Deputados dos EUA).

Governo paralisado

O resultado é uma paralisação no governo que já dura um mês e que é considerada a mais longa da história – ultrapassando o recorde anterior, de 21 dias, de 1995-1996, durante a gestão do então presidente Bill Clinton (1993-2001).

Essa paralisação ocorre desde 22 de dezembro e, segundo Trump, vai continuar até que os recursos para o muro sejam assegurados.

Trata-se de uma paralisação parcial porque o Congresso já custeou 75% do governo federal até setembro. Até agora, os recursos que ainda faltam ser aprovados afetam nove departamentos federais (ministérios), incluindo Agricultura, Transporte e Interior.

Devido à forma como o financiamento é distribuído entre as agências, certos serviços são afetados, embora possam tecnicamente estar sob os departamentos que já foram cobertos. Esse é o caso, por exemplo, da FDA, a agência de vigilância sanitária americana.

Nesse cenário, o governo não pode se comprometer com nenhuma outra despesa, levando a um congelamento parcial dos serviços e atividades governamentais até que os gastos sejam aprovados.

Como resultado, 25% de todo o governo federal parou de funcionar e 800 mil servidores estão com os vencimentos atrasados.

Democratas dizem que o muro é um desperdício de dinheiro dos contribuintes e acusam a administração Trump de “inventar uma crise”.

A seguir, sete gráficos e mapas mostram a quantas anda o projeto e a situação na fronteira EUA-México.

1. Construção do muro

Antes de Trump assumir o cargo, havia pouco mais de 1.000 km de barreira ao longo da fronteira sul – sendo cerca de 570 km para impedir a passagem de pedestres e o restante formado por cercas antiveículos.

Mapa mostrando as barreiras atuais na fronteira EUA-México

Às vésperas das eleições presidenciais de 2016, Trump prometeu construir um muro ao longo dos 3.200 km de fronteira com o México.

Ele esclareceu posteriormente que abrangeria apenas metade disso – e que a natureza, graças a “barreiras” como montanhas e rios, ajudaria a cuidar do resto.

Mas, desde que Trump entrou na Casa Branca, nenhuma construção nova em qualquer extensão do muro foi iniciada. Só algumas das barreiras existentes foram substituídas.

O Congresso aprovou até agora US$ 1,7 bilhão (R$ 6,4 bilhões) em financiamento para cerca de 200 km de barreiras novas e de substituição desde que Trump assumiu o cargo.

Apenas 64 km de barreiras de substituição foram construídas ou iniciadas. A expectativa é que em 2019 seja iniciada a construção de mais 61 km. Isso equivale a uma renovação de aproximadamente 15% das estruturas já existentes.

As primeiras obras que estendem barreira já existentes – o que pode ser chamado de “nova barreira” – começarão em fevereiro no Vale do Rio Grande, no Texas.

São dois projetos que cobrirão um total de 22,5 km – uma barreira com 9,6 km de extensão e outra com cerca de 12,9 quilômetros.

Apesar do empenho de Trump para ver o muro ao longo da fronteira, uma pesquisa feita este mês pelo Centro de Pesquisas Pew, com sede em Washington, indica que a maioria dos americanos – 58% – se opõe a expandi-lo consideravelmente, enquanto 40% o apoiam.

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2. Ninguém sabe realmente quanto custaria

Diversas estimativas consideravelmente diferentes para um muro de concreto foram apresentadas por órgãos oficiais e não-oficiais – variando de US$ 12 bilhões (R$ 45 bilhões) a US$ 70 bilhões (R$ 262 bilhões).

Gráfico mostrando os custos estimados para o muro do Presidente Trump

O custo inicial anunciado por Trump, entre US$ 8 bilhões (R$ 30 bilhões) e US$ 12 bilhões (R$ 45 bilhões) para um muro cobrindo metade da extensão da fronteira, foi amplamente contestado.

Os 1.046 km de cercas construídos na gestão do presidente George W. Bush custaram aproximadamente US$ 7 bilhões (R$ 26 bilhões), e certamente não correspondem ao muro que Trump prometeu na campanha, uma barreira “alta, forte e bonita”.

No entanto, Trump está pedindo agora US$ 5,7 bilhões (R$ 21,4 bilhões), além dos US$ 1,7 bilhões (R$ 6,4 bilhões) já alocados para barreiras novas e de substituição.

O Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos (DHS, na sigla em inglês) havia estimado que um muro que abrangesse metade da fronteira custaria no máximo US$ 25 milhões (R$ 93,8 milhões), mas agora afirma que ainda está analisando opções para determinar o montante.

A Alfândega e Proteção de Fronteiras (CPB, da sigla em inglês) – principal organização de controle de fronteiras dos Estados Unidos – diz que, em média, construir um novo muro de fronteira ou substituir a cerca existente custaria aproximadamente US$ 6,5 milhões (R$ 10,46 milhões) por milha.

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3. Trump queria concreto, mas agora está falando em aço

Trump mudou sua visão em relação à composição do muro.

Sua promessa de construir um “grande e belo muro” entre os EUA e o México foi bradada como um grito de guerra durante sua campanha eleitoral. No início, ele dizia que o faria em concreto.

Uma vez eleito, entretanto, Trump começou a falar em uma barreira feita de aço, para que os agentes de fronteira pudessem enxergar através dela.

E em outubro de 2017, quando sua administração revelou oito protótipos de muro de aproximadamente 9 metros de altura – eles eram uma combinação de concreto e metal.

Imagem mostra os oito protótipos do muro apresentados pela administração TrumpDireito de imagem Getty Images/BBC

Em dezembro, Trump disse que não quer mesmo construir um muro de concreto, mas sim um composto por “lâminas de aço desenhadas artisticamente”.

Pouco antes da paralisação do governo, ele tuitou uma imagem do projeto de sua “barreira de lâminas de aço”, que disse ser “totalmente eficaz e, ao mesmo tempo, bonita”.

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Funcionários da Agência de Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA disseram que nenhum dos protótipos da administração Trump testados em 2017 satisfez os requisitos operacionais.

Eles acrescentaram que tais protótipos, no entanto, teriam fornecido “dados valiosos” para ajudar a selecionar elementos de design no futuro.

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4. Número de apreensões na fronteira sul diminuiu com o tempo

Trump disse em um pronunciamento nacional no início de janeiro que o muro é necessário para conter uma “crescente crise humanitária e de segurança em nossa fronteira sul”, envolvendo “milhares de imigrantes ilegais”.

Em debate com a líder democrata da Câmara, Nancy Pelosi, e com o líder da minoria no Senado, Charles Schumer, Trump também disse que essas pessoas estavam “entrando aos montes no país”.

No entanto, os números mostram que as tentativas de travessia ilegal de fronteira têm registrado um declínio geral desde o ano 2000.

Gráfico mostrando como as apreensões de fronteira caíram desde 2000

Naquele ano, 1,6 milhão de pessoas foram detidas ao tentar atravessar a fronteira ilegalmente.

Em 2017, o primeiro ano do governo Trump, ele estava no menor patamar desde 1971. Em 2018, entretanto, esse número subiu (ver próximo gráfico).

Todos os congressistas de regiões que beiram a fronteira sul se opõem a essa barreira, argumentando que ela não melhoraria a segurança.

“Acho que construir essa estrutura de concreto de um mar a outro é a maneira mais cara e menos eficiente de se fazer a segurança”, disse o republicano Will Hurd, que representa um distrito do Texas com uma fronteira de mais de 1.200 km com o México.

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5. Mas as detenções e pedidos de asilo voltaram a aumentar entre 2017 e 2018

Entre 2017 e 2018, as detenções – o número de pessoas presas pelas autoridades – na fronteira entre o México e os EUA aumentaram em cerca de 100 mil e os pedidos de asilo aumentaram em cerca de 16 mil – um crescimento de 43%.

Gráfico mostrando prisões de fronteira dos EUA e pedidos de asilo em 2017 e 2018

Entre esses grupos havia um número crescente de famílias fugindo da violência na América Central e se entregando às autoridades dos EUA na fronteira. Muitos disseram às autoridades que temem voltar aos seus países de origem.

Alguns culpam a decisão de reduzir o número de refugiados permitidos nos Estados Unidos no âmbito do Programa de Admissão de Refugiados pelo aumento de pedidos de asilo na fronteira.

Para se candidatar ao status de refugiado nos EUA, estrangeiros devem obter permissão para entrar no país antes de viajar, mas aqueles que chegam à fronteira podem pedir asilo para evitar serem deportados de volta para uma situação de “insegurança real”.

Tais pedidos são então encaminhados aos agentes de asilo dos Serviços de Cidadania e Imigração dos EUA.

E, apesar das alegações de Trump, é improvável que qualquer nova barreira fronteiriça impeça esses migrantes de reivindicarem legalmente asilo em uma porta de entrada.

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6. A maior parte da imigração ilegal envolve pessoas com vistos expirados, e não as que cruzam a fronteira

Apesar de Trump ter culpado a suposta porosidade da fronteira sul pela imigração ilegal, a maior fatia dos imigrantes ilegais no país é composta pelos estrangeiros cujos vistos de permanência nos Estados Unidos expiraram.

Enquanto quase 400 mil pessoas foram presas tentando atravessar ilegalmente a fronteira sul do país no ano passado, mais de 700 mil que entraram nos EUA legalmente ultrapassaram a data prevista para partida em 2018, de acordo com o Departamento de Segurança Interna.

Gráfico mostrando o número de pessoas que ultrapassam o período de validade de seu visto, discriminadas por país de origem

Os canadenses formavam o maior grupo nessa situação, segundo dados de 2017 do DHS, seguidos por mexicanos e brasileiros.

Embora o número de pessoas que permanecem no país além do tempo permitido, em geral, tenha caído para cerca de 420 mil em maio de 2018 – ele ainda superava o número de pessoas presas tentando entrar ilegalmente pela fronteira México-EUA.

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7. É improvável que o muro impeça a entrada de drogas nos EUA

Trump afirmou que 90% da heroína encontrada nos Estados Unidos entra pela fronteira sul e que um muro ajudaria a impedir isso.

As apreensões de heroína em todo o país chegaram a 7.979 kg em 2017, com 39% apreendidos na fronteira EUA-México, de acordo com a Drug Enforcement Agency (DEA), órgão oficial encarregado da repressão e controle de narcóticos.

Mapa mostrando apreensões de heroína ao longo da fronteira EUA-México

A maioria das apreensões na fronteira ocorreu no corredor de San Diego – aproximadamente 1.073 kg em 2017, um aumento de 59% em relação ao ano anterior.

Embora a maior parte da heroína nos EUA seja procedente do México, o DEA diz que a maior parte dela é contrabandeada através de portos legais de entrada, escondida em veículos de propriedade privada ou caminhões de transporte, misturada com outras mercadorias.

Só uma pequena porcentagem das apreensões da droga foi feita entre os pontos de acesso – onde barreiras existem ou são propostas.

Design por Sandra Rodriguez Chillida.

Fonte: BBC