SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Na segunda semana do conflito que já deixou ao menos 427 mortos no Sudão, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, afirmou que o Exército do país africano e o grupo paramilitar Forças de Apoio Rápido concordaram nesta segunda-feira (24) com a implementação de um cessar-fogo de 72 horas.

A trégua, mediada pelos Estados Unidos, está prevista para entrar em vigor à meia-noite desta terça (25), no horário local. O acordo, contudo, é visto com ressalvas, já que tentativas semelhantes fracassaram.

Mesmo com esforços internacionais conter a crise, combates na capital, Cartum, e em outras cidades estratégicas não dão trégua. Mais cedo, o secretário-geral da ONU, António Guterres, havia alertado para o risco de uma “conflagração catastrófica”, afirmando que o conflito poderia se espalhar para outros países.

Ele pediu ao Conselho de Segurança das Nações Unidas “máxima pressão sobre as partes para acabar com a violência, restabelecer a ordem e regressar ao caminho da transição democrática”. Uma reunião com representantes dos 15 países que compõem o órgão está prevista para esta terça. “Devemos fazer tudo o que está ao nosso alcance para tirar o Sudão da beira deste abismo”, disse Guterres.

Diversas missões diplomáticas continuam empenhadas em resgatar cidadãos estrangeiros no país africano, mergulhado no caos desde o último dia 15, quando os combates explodiram. Nesta segunda, um comboio com 65 veículos transportou dezenas de crianças, diplomatas e funcionários de organizações humanitárias em uma jornada de 800 km que percorreu sob calor intenso o trajeto da capital, Cartum, até a cidade de Porto Sudão, no nordeste, onde é possível fugir de barco para nações vizinhas.

Ao todo, mais de mil cidadãos da União Europeia foram retirados do Sudão, disse o chefe da diplomacia do bloco, Josep Borrell. A Espanha anunciou nesta segunda a saída de cem pessoas, enquanto a França informou que sua embaixada no país africano será fechada “até novo aviso”.

Para aqueles que permanecem, a situação é cada vez mais sombria. Há escassez de alimentos, água potável, remédios e combustível. Sistemas de comunicação e de eletricidade também estão comprometidos, e os preços dispararam, segundo Farhan Ha, porta-voz-adjunto da ONU.

Segundo ele, suprimentos humanitários das Nações Unidas e outros produtos armazenados continuam alvos de saques. Já os conflitos intensos impedem as operações de socorro em algumas regiões do país.

“A rápida retirada de cidadãos ocidentais significa que o país está à beira do colapso. Mas esperamos um papel maior desses no apoio à estabilidade, pressionando para que os dois lados parem esta guerra”, disse o acadêmico Suleiman Awad, 43, à agência de notícias AFP.

Ao se desvencilhar diplomaticamente, o Ocidente pode permitir que a Rússia ganhe influência no Sudão, afirmou Pekka Haavisto, ministro das Relações Exteriores da Finlândia, que no início do mês passou a integrar a Otan, a aliança militar ocidental.

Antony Blinken manifestou preocupação semelhante. Segundo o americano, militares do Grupo Wagner, uma organização mercenária russa, ameaçam agravar o conflito na nação africana. O grupo nega envolvimento no conflito atual.

Ministro das Relações Exteriores do Quênia, Alfred Mutua, também sugeriu a atuação de forças externas no conflito do Sudão. “Estamos bastante preocupados com [o papel desempenhado por] alguns de nossos amigos no Oriente Médio, bem como a Rússia, que há muito apoiam um lado ou outro”, disse, sem entrar em detalhes.

O atual conflito é fruto das divergências dos antigos aliados Fatah al-Burhan, líder sudanês, e Hemedti, como é conhecido o chefe das RSF. Em 2019, eles derrubaram a ditadura de 30 anos de Omar al Bashir e, após um golpe em 2021, ocuparam os dois principais cargos em um conselho que supervisionava a transição política para um governo civil e planejava a fusão das Forças de Apoio Rápido com o Exército.