SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O governo da Espanha ofereceu nacionalidade aos mais de 200 ex-presos políticos da Nicarágua libertados e deportados aos EUA pelo regime de Daniel Ortega nesta quinta (9). A ditadura de Manágua retirou a nacionalidade dos opositores por considerá-los traidores.

De acordo com o chanceler espanhol, José Manuel Albares, a oferta já está em vigor e Madri entrará em contato com os nicaraguenses. A naturalização se dará pelo procedimento conhecido como carta de natureza, mais ágil por não estar sujeito às burocracias padrões.

Em uma decisão inesperada, a Nicarágua libertou 222 dos 245 presos políticos que mantinha em suas cadeias desde que Ortega endureceu o regime, após os protestos contra uma reforma da Previdência em 2018. Entre os libertos estão Cristiana Chamorro, pré-candidata à Presidência, Pedro Joaquín Chamorro, ex-ministro, e Francisco Aguirre, ex-chanceler.

Segundo a subsecretária de Estado dos EUA, Emily Mendrala, o país está em contato com Madri para facilitar o pedido de nacionalidade. Os ex-prisioneiros poderão escolher a opção que preferirem.

Também aterrissou nos EUA nesta quinta Dora María Téllez, que em 1978 liderou junto com Eden Pastora e Hugo Torres a tomada do Palácio Nacional de Manágua. A ação levou à libertação de dezenas de detidos. Na época, Téllez e Ortega lutavam contra a mesma ditadura: a da família Somoza, que esteve no poder na Nicarágua por 44 anos.

Após o anúncio da libertação, Ortega, que tem capitaneado uma perseguição a líderes católicos, disse que o bispo Rolando Álvarez, detido por conspiração e divulgação de notícias falsas, não quis ir para os EUA. O regime o transferiu da prisão domiciliar para o centro La Modelo. “Álvarez não quis acatar o que a lei manda”, disse o ditador.

Ele afirmou que enviou aos EUA uma lista de 228 presos, dos quais o país rejeitou quatro. Na hora do embarque, dois se negaram a ir. A Casa Branca alega que a decisão de enviar os ex-detidos foi unilateral de Manágua e que continuará pedindo a libertação dos dois prisioneiros que quiseram permanecer no país centro-americano.

Na quinta, o Departamento de Estado americano afirmou que o país facilitou o transporte dos presos e assegurou que os libertados “abandonaram a Nicarágua” voluntariamente para viver por dois anos nos EUA. A versão, porém, foi contestada pelos presos assim que eles deram suas primeiras entrevistas após aterrissar e disseram que foram retirados da prisão sem mais explicações e levados a um aeroporto.

“A libertação desses indivíduos”, disse o secretário de Estado Antony Blinken, “marca um passo construtivo para se falar sobre abusos de direitos humanos e abre portas para aprofundar o diálogo”.

O ex-candidato à Presidência Félix Maradiaga disse em uma de suas primeiras entrevistas que percebeu o que estava acontecendo quando estava na porta do avião. “Assinamos uma nota, muito sucinta, de uma linha, onde se lia que havíamos saído voluntariamente do país, sem qualquer outra explicação.”

A União Europeia também aprovou a medida. “Ainda que a UE rechace a decisão de privar os prisioneiros da cidadania nicaraguense e de seus direitos políticos, sua libertação é um passo positivo e muito esperado que deve ser seguido por diálogo e mais ação”, afirmou o bloco.

Sustentando sua retórica que chama de anti-imperialista, Ortega afirmou ainda na quinta que não negociou com os EUA em troca da libertação dos presos, embora o país sofra com sanções e a medida fosse uma das principais demandas da sociedade civil.

Ele afirmou que a ideia da deportação foi de sua esposa e vice-presidente, Rosario Murillo. “Estão voltando a um país que os usou para semear o terror, a morte, a destruição. Agora que os golpistas saíram, respiramos mais em paz”, afirmou Ortega.

“Eu já vinha falando que todas essas pessoas presas por atentar contra a soberania eram agentes de potências estrangeiras”, afirmou. “Não estamos pedindo que tirem as sanções. É um assunto de honra, de dignidade, de patriotismo. Que levem seus mercenários.”