SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Ganhador do prêmio Nobel da Paz em 1996, o bispo Carlos Filipe Ximenes Belo foi acusado de ter abusado sexualmente de rapazes menores de idade. Em uma reportagem publicada nesta quarta-feira (28) na revista holandesa “De Groene Amsterdammer”, resultado de uma investigação do periódico, Paulo (nome fictício) relata que o religioso tirou suas calças e fez sexo oral nele. Um outro homem, identificado como Roberto, afirma ter sido estuprado.

Os episódios teriam ocorrido na casa do bispo em Dili, no Timor Leste, nas décadas de 1980 e 1990, segundo a reportagem. Paulo tinha por volta de 15 anos e Roberto, 14. As supostas vítimas, que viviam na pobreza extrema, relatam ainda terem recebido dinheiro de Belo depois dos atos sexuais.

A reportagem afirma ter conversado também com outras vítimas que teriam sido abusadas pelo religioso e com pessoas com conhecimento do caso: oficiais do governo, políticos, funcionários de ONGs e representantes da Igreja Católica.

Quando procurado pela revista para comentar as acusações, o bispo chegou a pegar o telefone mas desligou imediatamente, segundo a reportagem. Depois da publicação, o Vaticano afirmou que vai investigar as acusações.

“Estávamos com medo de falar sobre isso. Tínhamos medo de passar a informação”, disse Paulo, acrescentando que o líder católico abusava de sua posição de poder. Segundo Roberto, o dinheiro que o religioso lhe dava era para que ele ficasse de boca calada.

Bispo da congregação salesiana, Carlos Filipe Ximenes Belo ganhou o Nobel quando tinha 48 anos e defendia há mais de dez os direitos humanos no Timor Leste, uma ex-colônia portuguesa ocupada pela Indonésia depois de sua independência, em 1975. Ele foi agraciado “por seu trabalho por uma solução justa e pacífica para o conflito do Timor”, segundo o comitê do prêmio na Noruega. À época da premiação, o bispo era “não apenas o poderoso chefe da Igreja Católica Romana de Timor Leste, mas também um herói nacional e um farol de esperança para o povo”, afirma a reportagem.

Belo dividiu o Nobel com José Ramos-Horta, outro líder da resistência do Timor Leste à época e atual presidente do país.

Roberto, uma das vítimas, afirmou à reportagem ter perdido diversos parentes devido à violenta ocupação da Indonésia, que se estendeu de 1975 a 1999 -naqueles anos, cerca de 183 mil timorenses morreram de fome, doenças e exaustão. Neste contexto, a Igreja Católica era muito respeitada no Timor Leste tanto pelo seu papel religioso quanto como uma instituição que ajudava o povo e oferecia proteção.

Belo tem hoje 74 anos e mora em Portugal. Ele renunciou à sua posição de bispo no início dos anos 2000, afirmando que sofria de fadiga mental e física, e anos mais tarde assumiu o cargo de padre-assistente em Maputo, no Moçambique, um trabalho de menos prestígio na hierarquia da igreja.

O religioso precisa de uma autorização para viajar, segundo a reportagem. A restrição é uma medida tomada pelas autoridades da igreja durante a investigação de um caso para proteger as vítimas, a investigação e o suspeito. A igreja também pode aplicar restrições do tipo após um veredito de culpa.

Esta é a segunda polêmica envolvendo o Nobel da Paz nos últimos anos. O prêmio que dá grande prestígio moral aos agraciados sofreu críticas no ano passado, depois de o ganhador de 2019, o premiê da Etiópia Abiy Ahmed, ordenar um ataque a rebeldes da região de Tigré, no norte do país. O conflito, um dos maiores do continente africano, provocou mais de 2 milhões de desabrigados e um número incerto de mortos, na casa dos milhares.