• Juliana Gragnani – @julianagragnani
  • Da BBC News Brasil em Londres

Torres gêmeas foram atingidas por dois aviões sequestrados por membros da Al-Qaeda na manhã de 11 de setembro de 2001

Crédito, Spencer Platt/Getty Images

Torres gêmeas foram atingidas por dois aviões sequestrados por membros da Al-Qaeda na manhã de 11 de setembro de 2001

A morte ou a morte. Na manhã de 11 de setembro de 2001, dezenas de pessoas tiveram de escolher entre essas duas alternativas. Com fogo e fumaça dentro dos prédios do World Trade Center, em Nova York, vítimas nos andares superiores começaram a pular, perdendo a vida ao cair de até 417 metros de altura.

A cena das pessoas pulando dos prédios atacados por dois aviões é um dos aspectos mais sombrios e sensíveis da tragédia que completa 20 anos neste sábado (11/9). Ficou eternizada em imagens.

Uma delas, a de um homem caindo quase que em um mergulho, de cabeça para baixo e o corpo paralelo às faixas das Torres Gêmeas, tornou-se icônica.

No dia seguinte à tragédia, diversos jornais publicaram a foto feita pelo fotógrafo da agência Associated Press Richard Drew. Nos anos que passaram, a imagem foi considerada insensível por alguns, muito dolorida para contemplar. Outros viram nela a terrível estética daquele pulo para a morte.

Esta é a história da icônica foto “The Falling Man” (o homem caindo).

“Era um dia qualquer em Nova York”, começa Richard Drew, hoje com 74 anos.

Fotógrafo desde os 19 anos, o experiente Drew, então com 54 anos, havia acabado de cobrir o torneio de tênis US Open, no bairro do Queens, em Nova York. Naquela terça-feira, 11 de setembro, ele cobriria a Semana de Moda de Nova York – mais especificamente, o primeiro desfile de moda de maternidade, com modelos grávidas de verdade. Drew acompanhou o desfile no Bryant Park, bem no centro de Manhattan, ao lado de um cinegrafista da CNN.

Enquanto conversavam, o câmera da CNN colocou a mão no ponto eletrônico que estava em seu ouvido. “Houve uma explosão no World Trade Center”, ele disse. E então: “Um avião atingiu o World Trade Center.”

Na mesma hora, o celular de Drew tocou. Era seu editor mandando ele correr para o local. Drew pegou sua câmera e saiu correndo para a Times Square. De lá, tomou o metrô em direção às Torres Gêmeas.

Quando emergiu das escadas sob o solo, viu uma imagem inesquecível: as duas torres destruídas, pegando fogo. Começou a fotografar as pessoas chocadas com o caos ao redor, o FBI já nas ruas isolando a área, os sedimentos na rua.

“Então percebi que a fumaça estava soprando do oeste para leste, e dei a volta para evitá-la. Fiquei ao lado das ambulâncias, entre uma socorrista e um policial”, conta.

A socorrista foi a primeira a se dar conta. Apontando para cima, gritou: “Meu deus, tem pessoas caindo do prédio!”, lembra Drew.

O fotógrafo apontou sua câmera. “Tirei o máximo de fotos que pude das pessoas caindo do edifício”, diz ele à BBC News Brasil.

“Eu não sei se estavam pulando por escolha própria ou se foram forçados a pular pelo fogo ou pela fumaça. Não sei por que fizeram o que fizeram. Só sei que eu tinha de registrar aquilo.”

O serviço forense de Nova York declarou depois que as pessoas que pularam dos edifícios não poderiam ser chamadas de “suicidas” porque elas foram forçadas para fora do prédio pela fumaça, fogo ou explosões. A causa da morte de todos os que perderam a vida com a queda das Torres Gêmeas, atacadas pela Al-Qaeda naquele dia, foi classificada como “homicídio” nas certidões de óbito.

Em uma reportagem de 2002, o jornal USA Today calculou, por meio de fotos, vídeos e entrevistas, que 200 pessoas morreram desta maneira na tragédia do 11 de setembro. Pelas fotos, o jornal The New York Times estimou 50 pessoas.

Segundo relatos de sobreviventes, ter visto pessoas saltando do prédio ao lado pode ter salvado a vida de centenas de pessoas que, ao ver o tamanho do desastre, correram para evacuar seu local de trabalho. Ao deixar os prédios, elas também viam corpos nas áreas ao redor das torres.

Enquanto fotografava, Drew experimentava algo sinistro: ele ouvia o barulho dos corpos atingindo o chão. “Alguns dizem que fui frio. Não é isso. Sou um jornalista treinado. Você mergulha no momento e só fotografa o que está acontecendo, em piloto automático”, diz.

“Quando alguém começava a cair, eu mirava com meu visor. Como eu estava trabalhando com uma câmera digital, ao segurar o dedo no botão da câmera, ela tirava uma série de fotos. E, assim, eu ia seguindo as pessoas que iam caindo do prédio.” Às 9:41, ele registrou para sempre os últimos momentos daquele homem.

Quando Drew voltou para a Redação e foi verificar suas fotos, ele soube instantaneamente que aquela era a mais forte delas. “Ele estava na vertical, com a cabeça para baixo, entre as duas torres. Tinha uma simetria ali. Mas ele só ficou assim durante um instante. Fosse outro momento, ele estaria em outra posição”, diz.

“Muita gente não gosta de ver essa foto. Acho que as pessoas se identificam, e têm medo de ter de enfrentar a mesma decisão que ele algum dia.”

Para ele, a imagem é representativa do que aconteceu naquele dia – “é uma das poucas que de fato mostram alguém morrendo no ataque mais grave que já sofremos nos EUA”, diz. Apesar de ser uma foto sobre a morte, avalia Drew, ela é uma foto “silenciosa”. “Não é como outras fotos violentas de mortes que ocorreram em guerras.”

Quando voltou para a casa naquela noite, Drew e um colega que não havia conseguido voltar para a sua casa sentaram e conversaram sobre tudo, menos sobre o que haviam visto naquele dia. Sua esposa conta, diz Drew, que ele se levantou de madrugada querendo aspirar a casa toda. “O estresse pós-traumático vem depois”, comenta ele. “Falar sobre o que aconteceu ajuda. Aquele foi um momento da minha história, assim como foi um momento da história.”

Outro momento da história e de sua história: quando tinha 21 anos e morava em Los Angeles, em 1968, Drew foi um dos quatro fotógrafos presentes em outro momento histórico – a morte do senador Bobby Kennedy, irmão do ex-presidente John F Kennedy.

“Eu estava no palco atrás dele para fotografá-lo quando ele estava discursando. Fiquei com sede e fui para a cozinha tomar água”, conta Drew. “Ele saiu pela cozinha, então eu o segui. Quando ele foi atingido, eu subi numa mesa perto dele e o fotografei no chão.”

“Eu só estava fazendo meu trabalho, assim como só estava fazendo meu trabalho anos depois, no 11 de setembro.”

Crédito, Getty

Há vinte anos, atentado em Nova York tiraria a vida de quase 3 mil pessoas

Quem é esse homem?

O fotógrafo do “O Homem Caindo” diz já ter refletido um pouco sobre quem era o homem que registrou pulando de uma das torres gêmeas, mas nunca “tão a fundo”.

“Ele foi uma entre as quase 3 mil pessoas que morreram naquele dia. Eu não sei seu nome, nem sei sobre a decisão que ele teve de tomar. Sei que ele caiu de um prédio e eu estava lá para capturar aquele momento.”

Mas o mistério ao redor de sua identidade inquietou outras pessoas.

Uma delas, o jornalista americano Tom Junod. Dois anos depois do 11 de setembro, Junod escreveu uma reportagem de capa para a revista “Esquire” cunhando o nome “The Falling Man” para a foto e tentando identificar o homem na imagem.

Junod chegou a dois nomes: Norberto Hernandez, um chef do restaurante Windows on the World, que ficava no 106o andar da Torre Norte. Mas os familiares de Hernandez disseram que não poderia ser ele por causa das roupas que ele estava usando.

O segundo homem era Jonathan Briley, um engenheiro de som de 43 anos que também trabalhava no restaurante. Os irmãos de Briley disseram pensar que, de acordo com as roupas e o corpo do homem, poderia ser ele na foto. É possível que seja ele – mas não há como ter certeza.

Em 2006, o diretor americano Henry Singer fez um documentário baseado na reportagem de Junod, usando outras imagens capturadas naquele dia.

Avião em Cabul

Escolher entre a morte e a morte parece ter sido também o que aconteceu há três semanas no Afeganistão, quando, em total desespero para deixar o país, homens se penduraram na fuselagem de um avião americano.

As duas imagens são como duas pontas terríveis dessa história que se uniram 20 anos depois.

Quase um mês após os ataques às Torres Gêmeas, o então presidente americano George W. Bush anunciou a guerra contra o Afeganistão. Os Estados Unidos tirariam do poder o Talebã, que abrigava a Al Qaeda, autora dos atentados, no território que controlava.

Crédito, AFP

Afegãos correram para o aeroporto de Cabul e se agarram a um avião na esperança de deixar o país

Vinte anos depois, quando o atual presidente americano Joe Biden conduziu os Estados Unidos ao fim da guerra, retirando as tropas americanas do Afeganistão, o mundo viu o Talebã voltar ao poder em um tempo extraordinário.

Foi o desespero de ficar em um país novamente controlado pelo Talebã que fez os afegãos se segurarem às asas e à fuselagem de um avião. O avião decola, e corpos são gravados ao despencarem para o nada – assim como despencaram no 11 de setembro. Restos mortais foram encontrados no trem de pouso depois que uma aeronave aterrissou no Catar. Um jovem jogador de futebol de 19 anos, Zaki Anwari, morreu ao tentar fugir dessa maneira.

O fotógrafo de “O Homem Caindo” não quis comentar sobre o Afeganistão nem sobre política. Hoje, Drew fotografa a emoção dos “brokers” na Bolsa de Valores de Nova York, bem perto de onde ficavam as Torres Gêmeas – atualmente um memorial para as vítimas do 11 de setembro.

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Fonte: BBC

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