14 dezembro 2021

Atualizado Há 7 horas

Carrie Schmitt

Crédito, Michael Sladek

Carrie Schmitt mudou-se para Seattle, no Estado de Washington, em busca de um clima frio

Quando a alergia ao calor, uma condição que pode representar risco de morte, deixou Carrie Schmitt incapaz de sair da cama, ela teve de largar seu emprego e se mudar para o outro lado dos Estados Unidos em busca de um clima mais frio. Isso também a levou a se tornar uma artista, como conta Emily Oomen.

Num dia de 2003, no Estado americano de Ohio, Carrie Schmitt estava caminhando com seu filho. Enquanto andavam, ela começou a se sentir mal, e suas pernas começaram a inchar.

As pernas de Carrie chegaram a ficar quase três vezes seu tamanho normal, e ela ligou para os serviços de emergência. Foi levada rapidamente ao hospital, com choque anafilático.

Os médicos que tratavam estavam intrigados. Inicialmente, eles suspeitavam que a reação fosse ligada a uma picada de abelha ou a pólen, mas Carrie foi testada para ambos e não era alérgica a nenhum dos dois.

Recuperada, ela recebeu alta do hospital, mas continuou tendo reações ao longo dos meses seguintes.

Depois de muitos exames e consultas, os médicos finalmente chegaram a um acordo sobre o diagnóstico: urticária colinérgica e solar. Carrie era alérgica ao calor e ao Sol.

Uma nova vida

Amante do clima quente e do Sol, ela ficou arrasada. “Foi como a morte da minha vida anterior”, diz ela.

A alergia de Carrie se tornara tão severa que ela não conseguia mais subir escadas ou fazer movimentos rápidos, como limpar o chão. Se seu corpo percebesse calor, entrava em choque anafilático.

A médica Mansi Kanuga, especialista em alergias da clínica Mayo, diz que existe uma “variedade de teorias” sobre a causa da urticária colinérgica e solar, mas “o mecanismo específico que permeia” essa condição “não é bem compreendido”.

“Esses distúrbios provavelmente resultam de uma elevada sensibilidade de células de alergia (conhecidas como mastócitos) a condições ou estímulos do ambiente”, afirma ela.

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O que é urticária?

  • Urticária são uma espécie de erupções que aparecem na pele e provocam coceira.
  • Elas podem ser provocadas pelo sistema imunológico, que começa atacar, de forma equivocada, tecidos saudáveis.
  • Uma em sete pessoas com urticaria crônica experimenta depressão ou ansiedade como resultado dessa condição.
  • Em muitos casos, não se pode identificar uma causa óbvia para o problema.
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Mastócitos são parte do sistema imunológico e ajudam a combater infecções. Quando eles detectam um alérgeno – substância que pode provocar uma reação alérgica -, eles liberam histamina.

O especialista de Carrie acredita que suas alergias possam estar ligadas ao nascimento de seu filho. Ela perdeu bastante peso enquanto o amamentava e, ao contrário do que aconteceu nos casos de seus outros dois bebês, seu filho tinha um apetite voraz e mamava quase constantemente.

Carrie ficou tão enfraquecida de nutrientes que seu cabelo começou a cair. Segundo ela, seus médicos acreditam que seu corpo possa ter pensado estar sendo atacado e, de forma equivocada, identificou o calor como um inimigo.

Enquanto tentava compreender seu diagnóstico, Carrie ficou cada vez mais frustrada. O único lugar seguro para ela passou a ser sua cama, da qual que ela não conseguiu sair por meses.

Ela afirma que teve sorte: na época, seu marido tinha um bom emprego e um seguro de saúde e foi capaz de cuidar das crianças, mas ela teve dificuldades em aceitar sua condição.

Ela sempre pensava: “Eu não posso ficar deitada aqui por 50 anos. Essa não pode ser minha vida. Um dia, uma voz apareceu na minha cabeça e disse: ‘Agora que sua vida acabou, por que você não faz o que você quer e começa a pintar?’.

Uma nova carreira

Carrie sempre havia gostado de arte, mas desistira quando era adolescente, convencida por outros a seguir uma carreira mais segura.

Antes de sua alergia ao calor, ela trabalhara como escritora médica no Cincinnati Children’s Hospital, onde ela escrevia para periódicos médicos, manuais e o site do hospital. Mas, quando ela começou a pintar, “isso me levou para esse outro mundo, onde minha condição física não importava”, diz ela.

“Eu não via a hora de levantar de manhã e pintar. Era tudo o que eu queria fazer. Eu desenvolvi uma relação realmente linda com a criatividade, porque ela me salvou.”

Pintura de Carrie Schmitt

Crédito, Carrie Schmitt

Os quadros que Carrie Schmitt passou a pintar trazem flores como tema de destaque

Carrie podia se sentar na cama e equilibrar seu caderno de esboços em seus joelhos e cercar-se de todos os materiais de que precisava.

Ela descreve a si mesma como uma “pintora intuitiva”, deixando que a pintura emerja sem um plano, o que, segundo ela, cria algo “maior do que eu poderia imaginar”.

Suas pinturas são coloridas e trazem muitas flores, evocando a história de sua família de jardineiros.

Quando Carrie começou a pintar, ela também estava experimentando diferentes tratamentos.

A urticária colinérgica e solar é frequentemente controlada com a redução da exposição a possíveis causadores da alergia, como banhos quentes e luz do Sol direta. Anti-histamínicos também podem ser úteis para reduzir a coceira e erupções da pele.

Mas Carrie descobriu que sua alergia não respondia bem a tratamentos tradicionais e começou a explorar abordagens mais holísticas, incluindo as chamadas terapêuticas avançadas contra alergia (AAT, na sigla em inglês).

As AAT envolvem a colocação de compressas pelo corpo, com a aplicação de uma pressão leve. É similar à acupuntura, mas sem o uso de agulhas.

Kanuga diz que, no momento, as AAT não são uma abordagem estudada para a administração das alergias. Por causa disso, Carrie estava cética, mas afirmou que, depois dos tratamentos, a melhor foi “tão imediata que me chocou”.

Ela passou a ser capaz de sair da cama e caminhar, pôde voltar a dirigir e a usar as escadas. Ocasionalmente ela tinha alguma erupção na pele, mas as reações foram menores.

Um novo Estado

Havia um outro tratamento, mais drástico, que seus médicos sugeriram que poderiam beneficiá-la, mas que mudaria sua vida: mudar-se de Ohio (leste dos EUA), onde as temperaturas podem atingir máximas de 38 graus, para um clima mais temperado.

Carrie decidiu mergulhar na ideia e mudou-se para a chuvosa Seattle (no Estado de Washington, no oeste dos EUA, fronteira com o Canadá), onde as temperaturas máximas são geralmente em torno de 21 graus.

Com o ambiente mais frio, Carrie começou a ver melhoras graduais em sua condição até que passou a ser capaz de fazer ioga e pintar em seu quarto.

Ela começou a procurar um estúdio mas depois de se deparar com os preços exorbitantes de Seattle, ela comprou um ônibus escolar, pintou-o de rosa, deu-lhe o nome de Rosie e o transformou num espaço artístico.

Carrie Schmitt pintando

Crédito, Michael Sladek

Em Seattle, Carrie transformou um ônibus escolar num espaço artístico, onde ela pinta seus quadros

“Acabou sendo uma das maiores bênçãos da minha vida”, diz Carrie. Apesar de Carrie ter mais liberdade em Seattle, ela ainda precisa ter cuidado com os verões cada vez mais quentes em Washington e os incêndios florestais. Quando os verões são quentes demais, ela precisa se abrigar em quartos de hotel com ar condicionado ou cabines em alguma das ilhas do Estado de Washington, mais frias.

Ela admite que às vezes administrar sua condição pode ser difícil. Ela não pode ir aos eventos esportivos de seus filhos quando está quente demais e depende de sua família para ajudá-la com compras e tarefas da casa que exigem muito movimento.

Mas também há aspectos positivos. Sua condição a levou a escrever suas memórias – The Story of Every Flower (A História de Cada Flor) -, sobre sua arte, e está dando aulas sobre pintura online na esperança de inspirar outros para abraçar a criatividade em tempos difíceis.

“Eu sinto que ela pode ser uma aliada, ou sua amiga, ou amada”, afirma. “Está sempre comigo.”

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Fonte: BBC

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