• Author, Luís Barrucho
  • Role, Da BBC News Brasil em Londres
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  • 21 fevereiro 2023

    Atualizado Há 4 horas

Nicole Mandinga e um de seus bebês gêmeos

Crédito, Arquivo pessoal/Nicole Mandinga

Nicole e família deixaram a casa onde moravam ‘só com roupa do corpo’; eles criaram vaquinha virtual para refazer a vida

Em meio ao temporal que caiu no fim de semana no litoral norte de São Paulo, a estudante Nicole Mandinga, de 17 anos, moradora do bairro de Topolândia, em São Sebastião, só teve tempo de pegar seus dois gêmeos recém-nascidos, Akin e Kevin, e deixar a casa onde mora “com a roupa do corpo” e “pelos fundos, pulando para o terreno do vizinho”.

A família perdeu quase tudo que tinha está agora abrigada na casa de uma parente.

“Começou a chuva e eu e minha mãe já estávamos dormindo. Um vizinho bateu na (porta) da nossa casa e falou para ficarmos atentas, pois havia muita lama caindo da barreira, e ninguém estava conseguindo subir ou descer (a rua)”, relembra ela à BBC News Brasil por telefone.

“Mas, então, ouvimos gritos, pessoas pedindo por socorro. Entramos em desespero, vimos a casa do vizinho da frente sendo levada. Só pegamos os gêmeos e saímos de casa pelos fundos pulando o muro para poder nos salvar.”

“Saímos com a roupa do corpo. Perdemos tudo, inclusive todo o enxoval que havíamos ganhado para os bebês”, acrescenta.

A casa de Nicole fica em uma encosta e está inacessível devido ao excesso de lama e pedras trazidas pelas chuvas fortes que atingiram a região no último fim de semana.

“Caiu um poste na cozinha da nossa casa e quebrou o teto. Mas não alagou. Tivemos que sair por uma porta do meu quarto que dá acesso aos fundos e pulamos para a casa do vizinho. E esperamos pelo socorro da Defesa Civil”, conta.

“Perdemos tudo. Não temos como voltar para casa”, completa.

Teto da cozinha da casa de Nicole após queda de poste de luz

Crédito, Arquivo pessoal/Nicole Mandinga

Teto da cozinha da casa de Nicole após queda de poste de luz

Nicole diz que parte da família está agora alojada na casa de sua tia, próxima ao imóvel onde morava, que era alugado.

Ela acredita que se chover novamente, muito provavelmente “a água vai levar a nossa casa”.

A família criou uma vaquinha virtual para arrecadar recursos e poder refazer a vida. Além de Nicole, sua mãe e os gêmeos, moravam na casa seus outros quatro irmãos e o padrasto.

Como é muito grande, a família se dividiu em casas de parentes e amigos e está sem lugar fixo para morar.

São Sebastião foi a cidade mais afetada pelas chuvas históricas que atingiram o litoral norte de São Paulo no último fim de semana. Alagamentos e deslizamentos de terra que se seguiram à tempestade mataram ali pelo menos 40 pessoas.

Há relatos de centenas de desabrigados. Faltam água e comida em algumas localidades.

Água custando R$ 93

Na manhã desta terça-feira, o repórter da TV Globo Walace Lara chorou ao vivo ao relatar que viu comerciantes vendendo um litro de água por R$ 93 na região.

Lara relatou, durante entrada no Bom Dia SP, que, quando esteve em uma comunidade em Topolândia, bairro onde fica a casa de Nicole e sua família, viu “pelo menos cem pessoas tirando lama” de dentro dos imóveis.

“Desculpa, gente, vou respirar aqui e vou falar (…) É uma situação muito difícil de se ver e acompanhar. As cidades não têm estrutura”.

“É difícil ouvir o depoimento que a gente ouviu agora e não se emocionar. Cobrar R$ 93 em um litro de água na situação que nós estamos aqui é inacreditável”, lamentou com voz embargada.

Pelo menos 44 pessoas morreram em consequência do temporal, sendo 43 em São Sebastião e uma em Ubatuba. O total de pessoas fora de casa, desabrigadas ou desalojadas, chega a 2,5 mil.

Já os desaparecidos somam 40, mas esse número pode aumentar, pois há relatos de que pessoas ainda possam estar soterradas.

– Este texto foi publicado em

Fonte: BBC