Dia desses, não me pergunte como, entrei de gaiato numa festa em uma balada coalhada de farialimers, itaimers e fauna correlata.

O cardápio do lugar, como era de se esperar, oferecia o combo energético + birita. Seis latinhas de energético e uma garrafa de uísque Johnnie Walker Blue Label: R$ 2000.

Apontei o absurdo para o fulano que estava ao meu lado, alguém que eu acabara de conhecer. Ele não achou tão absurdo assim.

“Você mede a riqueza de uma pessoa pela grana que ela gasta sem pensar. Para mim, é R$ 20. Para alguns, é R$ 2000. Não faz diferença para esses caras.”

Sensato, porém a léguas de distância do ponto. Se eu fosse rico, compraria uísque para a balada inteira. E jogaria pelo ralo o energético. Não tem cabimento estragar um destilado bom com aquela porcaria.

De certo modo, meu novo amigo tinha razão. Os ricos brasileiros estão se lixando para o bom senso. Compram o que é caro para marcar a posição social.

Um açougue que eu frequento vende carne de gado da raça wagyu, o tal kobe beef. Eu me divirto com as etiquetas. Um naco de contrafilé, quase 600 contos. As SUVs que embicam no açougue –bloqueando a calçada para carrinhos de bebê e cadeiras de rodas– compram sem pestanejar.

Fico imaginando o churrasco desse pessoal. O patriarca deve bradar aos quatro ventos que adquiriu o bife mais caro da Via Láctea Ocidental. Para o caso de alguém duvidar, ele guardou a embalagem com o preço.

A ostentação é o que move o mercado de vinhos de alta gama. Tirar da cartola um Cheval Blanc ou um Romanée-Conti equivale a colocar o p*u na mesa. É um artifício comum de homens abonados, vaidosos e com o falo já adormecido pela idade.

Vinhos muito, muito caros têm valor de revenda descolado da qualidade real do produto. A demanda é insana por causa dos brindes corporativos e dos estabelecimentos de luxo.

Esses vinhos acabam nas adegas dos restaurantes de gente rica, onde o cartão corporativo cobre o rombo com o saldo de outrem. Ou são arrematados por empresas para bajular clientes e autoridades, que os bebem como se fosse Grapette. O mimo nunca é entregue sem expectativa de retribuição. E assim se movem as engrenagens das relações promíscuas do poder.

Dessas aberrações, a que mais me irrita é o ouro comestível. Não tem gosto de nada e serve tão-somente para elevar o preço do alimento em questão.

Tempos atrás, fiz compras no único empório gourmet de Vitória –onde o IDH não é exatamente o de Monte Carlo. Na saída, me deparei com um moinho gigante de pimenta-do-reino, em acrílico transparente. Grão por grão, todos cobertos de ouro.

Quis fazer graça com a dona da birosca: “Mas quem compra um negócio desses?”. Séria, ela me fitou e respondeu: “Sai muito para presentes.”

Se ganhasse pimenta banhada a ouro, eu a usaria somente quando estivesse sozinho em casa. Não existe nada mais jeca na gastronomia.

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Fonte: Folha de S.Paulo