Há pouco menos de 7 anos, em julho de 2014, eu tinha um blog chamado Bar do Nogueira e, lá, escrevi um post intitulado “Descanse em paz, Vila Madalena”.

O contexto não poderia ser mais diferente. O Brasil recebia a Copa do Mundo e os turistas que vinham com ela, e o clima de festa era permanente, apesar da campanha ridícula da seleção brasileira. A Vila Madalena se tornou um Carnaval 24/7, com todos os incômodos de uma festa fora de controle: moradores reclamavam do barulho e da sujeira que a multidão deixava no bairro.

No texto, eu falava que a vocação boêmia da Vila havia degringolado, sem volta possível. Ao anunciar a morte do bairro, não tinha a menor intenção de ser profético ou algo assim. Era apenas o desfecho mais plausível, na minha opinião, para os excessos da botecagem predatória que se instalou ali.

Eis que hoje leio, aqui na Folha, um relato da quebradeira geral da Vila Madalena, com ruas ermas e placas de aluguel nas portas baixadas dos antigos bares. Dá uma tristeza enorme ver minha previsão se concretizar, ainda mais pela ação de uma peste fora do alcance de qualquer radar.

Ouvido pela reportagem, o dono de um bar solta os cachorros nas medidas restritivas impostas pelo governo estadual na pandemia. Não vou dizer que o governo agiu 100% corretamente, pois talvez tenha deixado de dar o devido auxílio fiscal para os comerciantes. Não sei se os cofres públicos suportariam uma ajuda robusta. Mas de uma coisa eu estou certo.

Quem está destruindo o setor de bares e restaurantes é a pandemia, não os governos.

A população está apavorada e sem dinheiro. Com razão, guarda o que ainda tem em vez de consumir. Um sintoma disso é a queda, segundo o mesmo texto, dos pedidos de comida para entrega –setor que inicialmente cresceu devido ao isolamento doméstico.

Toda a economia, ou melhor, toda a humanidade está em frangalhos depois de quase um ano e meio de peste. Turismo, aviação, eventos e convenções, tudo isso desmoronou. Nada indica que esses setores voltarão a funcionar como antes quando a doença baixar a bola.

O medo vai demorar para passar, o dinheiro continuará curto e, percebemos, muitas das coisas que fazíamos presencialmente podem ser feitas de forma remota, gastando menos tempo e menos dinheiro.

A Vila Madalena não é a única vítima da Covid no mapa da cidade de São Paulo. A região da Berrini, ocupada majoritariamente por torres de escritórios, também se esvaziou.

Vamos precisar lidar com os prédios vazios, com os bairros desinchados, com a economia menor, com a falta de dinheiro.

O pesadelo só começou.

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Fonte: Folha de S.Paulo