Terei a felicidade, neste ano quase todo lazarento, de passar o Dia das Crianças com Antônio, meu primeiro neto, nascido há seis meses em Brasília.

Na condição de avô, tento assistir minha filha no sentido de dar assistência –sem o peso da responsabilidade paterna nas decisões referentes ao pequeno pirralho. Na maior parte do tempo, eu assisto ao baile que filha e genro tomam da criança, 24 horas por dia.

Minha chegada coincidiu com a introdução dos alimentos sólidos na dieta do Tom, que vinha felizão na base do leite materno. Fui mandado para a cozinha com a missão de preparar comida de bebê. Os amigos da filha já entraram numas de “papinha bruta” comigo. Gente pândega.

O fato é que a comida servida a um fedelho de meio ano de idade é bem bruta mesmo –nada rebuscada, sem sal, mão levíssima no tempero, o ingrediente quase puro. A criança precisa conhecer os sabores, processar um quintilhão de novas informações; os adultos precisam ser extremamente pacientes com ela.

Marquei dois golaços com o Tom. Ele curtiu a abóbora assada e adorou o feijão com um nadinha de cebola e alho. Antes disso, havia rejeitado mamão e outras frutas. Estava enfezado. Depois de se aliviar na fralda, voltou o bom humor e veio a fome.

Ensinar crianças a comer é uma tarefa inglória. É preciso admitir isso para então se resignar com a obrigação parental. Porque contemporizar leva a acochambrar. “Eu adoro cuidar da alimentação do Enzo, mas hoje vou tirar o dia para mim.” Lê-se nas entrelinhas: “Ele vai jantar um miojão”.

Não que a convivência com filhos pequenos seja desagradável, pelo contrário. Mas a missão de educar –educação alimentar inclusa– progride em andamento mais moroso do que desejaríamos. A celebração do sucesso só vem depois de uma longa série de fracassos. Como tudo na vida, aliás.

Se as vitórias vão para o álbum de família, a rotina é marcada por eventos altamente frustrantes –tanto para o educador quanto para o educando. Lidar bem com a frustração é condição irrevogável para seguir em frente.

Como avô-espectador, tenho observado essa rotina com olhar quase científico. O menino, apresentado à primeira banana da vida, não a identificou como alimento. Os estranhamentos se sucedem e se atropelam, deixando um rastro de comida espalhada pela casa.

A coisa não melhora no passar dos anos, se me lembro bem. A criança testa a paciência dos pais o tempo todo, com birras e manhas. Meu Pedro, agora com 8 anos, inventou que não gostava de frango porque viu o bicho cru, degolado e depenado numa oficina da escolinha. Eu e a mãe dele ainda nos esforçamos para demovê-lo dessa bobagem.

É muito mais fácil desistir e deixar o delinquente infantil almoçar sorvete de creme. Também é fácil julgar os pais com crias que só aceitam macarrãozinho na manteiga. Difícil é a rotina que eu tenho visto aqui em Brasília, com o pequeno Tonho.

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Fonte: Folha de S.Paulo