RENAN MARRA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Empresários que ganharam fôlego no fim do ano voltam ao cenário de incerteza com a disseminação da variante ômicron do coronavírus e recuo nas projeções de vendas após o cancelamento do Carnaval de rua em várias cidades do país.

A alta de casos de Covid diminui o fluxo de clientes e muda as operações de pequenas e médias empresas que, em alguns casos, precisam até paralisar as atividades em função do afastamento de funcionários contaminados pelo vírus.

Em levantamento da Fecomércio-RJ, 39,2% dos empresários afirmaram que tiveram de afastar funcionários diagnosticados com Covid na primeira semana de janeiro.

Para 40,5% dos comerciantes, os negócios foram prejudicados ou muito prejudicados durante o período. A pesquisa foi feita com 319 empreendedores do estado do Rio de Janeiro.

No Carnaval de 2020, pouco antes da crise sanitária, foliões locais e turistas movimentaram R$ 906 milhões somente na cidade de São Paulo. O valor correspondeu a 6,5% da receita turística estimada pela prefeitura para todo o ano.

Dono de uma unidade da rede de franquias Espetto Carioca na Consolação, região central da capital paulista, o empresário Antônio Martins, 36, investiu R$ 12 mil na compra de copos e talheres esperando vender em fevereiro valor próximo ao alcançado em 2020, quando teve crescimento de 40% no faturamento.

“Tivemos um fim de ano muito bom com a retomada das atividades presenciais de empresas”, afirma Martins. “Chegamos a contratar mais funcionários e, como preparativo para o Carnaval, decidimos investir em utensílios personalizados, que precisam ser encomendados com antecedência. Agora, nossas expectativas de faturamento estão prejudicadas.”

Diante de um novo cenário, o empreendedor decidiu não renovar os contratos temporários de colaboradores que deveriam ficar na empresa pelo menos até o Carnaval.

“A variante apareceu quando as coisas estavam melhorando. Passamos muito tempo fechados e as contas acumularam. Se não tivéssemos investido nos utensílios, usaríamos os recursos para proteger mais nosso caixa”, diz.

Atualmente o estabelecimento de Martins na Consolação fatura em média R$ 250 mil por mês, o que representa metade do valor registrado antes da pandemia.

De acordo com pesquisa da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes), 71% dos empresários do setor têm empréstimos bancários contratados -destes 22% estão com pelo menos uma parcela em atraso. Entre os devedores, 29% têm boletos vencidos há mais de 90 dias.

O setor de alimentação é o que mais gera movimento durante os dias de Carnaval, segundo estudo da CNC (Confederação Nacional do Comércio). Em 2020, bares e restaurantes faturaram R$ 4,8 bilhões no Brasil durante o período, o que representou 60% das receitas relacionadas ao turismo carnavalesco.

O impacto do cancelamento do Carnaval de rua este ano deverá ser maior porque, em 2021, ninguém mexeu no orçamento nem investiu para os dias de folia, diferentemente do que aconteceu nos últimos meses, diz Mariana Aldrigui, presidente do Conselho de Turismo da Fecomercio-SP. “Isso enfraquece toda uma estrutura que poderia se beneficiar com a realização da festa.”

Não fosse o agravamento da pandemia, o Carnaval teria coroado o que seria, segundo Aldrigui, a retomada efetiva do turismo brasileiro. Ela afirma que o período de melhor resultado financeiro para o país estaria concentrado entre a primeira semana de dezembro e o final do Carnaval.

Fundadora da loja Osada, a empreendedora Roberta Rodrigues, 47, viu o faturamento praticamente zerar com o cancelamento do Carnaval. Ela produz e comercializa o chamado tapa-mamilo, acessório usado principalmente por foliões dos blocos de rua.

Os estoques e os problemas da empreendedora aumentaram. As vendas físicas e online caíram, e Rodrigues contabiliza prejuízo com o pagamento de parcelas mensais para disponibilizar suas mercadorias em um ecommerce.

“A plataforma permitiu congelar as operações. Voltei quando a pandemia arrefeceu, mas estou no vermelho de novo”, diz ela, que dá aulas de inglês para complementar a renda. Hoje, seu estoque de tapa-mamilos corresponde a um ano e meio de vendas.

Em contextos de crise, é recomendado que o empresário compre o estritamente necessário para o dia a dia, orienta Juam Rosa, fundador da Complement Consultoria e Marketing, que atua nas áreas de prevenção de perdas, gestão e processos empresariais.
A comunicação com fornecedores ou idas ao supermercado podem aumentar, mas o estoque enxuto evita desperdícios de produtos em períodos de incerteza.

“Em alguns casos, podem faltar mercadorias. Mas é melhor perder 10% de vendas do que morrer na praia com o estoque, ficar sem caixa e não conseguir pagar o boleto no fim do mês”, afirma Rosa.

Empresas que não foram atingidas por afastamentos de funcionários têm como alternativa a elaboração de ações de marketing que podem incluir combos, promoções ou eventos temáticos, de modo que a mão de obra contratada não fique ociosa, diz Lucia Amelia Gomes, consultora de negócios do Sebrae-SP.

Se a empresa tem recurso financeiro escasso e registra queda na receita, uma possibilidade é adoção de escala 12 horas por 36 horas, em que o funcionário trabalha em um dia e folga no outro. Assim, o empresário consegue economizar a metade do valor do vale transporte pago no mês, aliviando o caixa da companhia.

Nesse caso, ele precisa consultar a viabilidade da mudança com o sindicato ou associação da categoria.

Negociar com fornecedores para alongar o máximo prazos de pagamento e tentar antecipar recebíveis são outras medidas que protegem o caixa e evitam o colapso da empresa em períodos com restrições mais duras, afirma Luiz Henrique Barbosa, fundador da consultoria C2W Consulting.

“O ambiente é de muita incerteza e os empreendedores parecem que estão em uma montanha-russa. Na pandemia, ser conservador em relação às receitas pode evitar perdas e a degradação do negócio. O momento é de cautela.”