KLAUS RICHMOND
SANTOS, SP (FOLHAPRESS) – O centroavante Edu conta sem qualquer rodeio ter ficado mexido quando soube de uma proposta do Cruzeiro poucos dias depois do encerramento da última Série B, no início de dezembro. À época, ainda nem sabia que trabalharia sob os olhos de alguém conhece bem sua posição, Ronaldo.

“Quis fechar na mesma hora. Falei ao meu empresário para aceitar, estava convicto”, diz à reportagem.

O jogador de 29 anos tinha bem viva na memória uma cena que vivenciara em 9 de novembro de 2021, atuando pelo Brusque, equipe catarinense pela qual foi artilheiro da competição com 17 gols.
No ano de seu centenário, o Cruzeiro precisava vencer o Brusque pela 35ª rodada para assegurar a permanência na segunda divisão nacional. Edu ficou chocado com o apoio de cerca de 32 mil torcedores ainda no aquecimento.

“A festa que faziam foi algo que me marcou, era inexplicável. Eu falava aos meus companheiros dentro de campo: em um dia de semana, com o time sem chances de subir e ameaçado de rebaixamento, não era normal tudo aquilo”, conta.

Ele enxergou no momento do Cruzeiro o retrato da sua própria superação na carreira. Cria das categorias de base do Vasco, Edu rodou por diversos clubes menores até encontrar, quase depois de uma década e já com idade considerada avançada para o futebol, sua melhor fase.

“O meu primeiro salário no Brusque era de R$ 600, mal dava para pagar uma conta na época. Não tenho vergonha nenhuma em falar, mas precisei trabalhar muito para conseguir algo no futebol”, relata.

“Passei por muitas dificuldades mesmo. Eu me recordo de quando estava em um time pequeno que jogou a semifinal da Copa Rio. Chegamos para almoçar e a comida estava toda azeda, estragada mesmo. Tivemos que ir para campo sem nada na barriga, debaixo de sol de 38 graus.”

O salário modesto em Santa Catarina uma é recordação de 2016. Antes disso, passou pela base de clubes como Botafogo, Portuguesa-RJ e Flamengo até começar a rodar por pequenos do Rio, como Boa Vista, São Gonçalo, Itaboraí e Nova Iguaçu. Ele quase desistiu de tudo em 2013.

“Meu contrato com o Flamengo acabou e um empresário me prometeu algo. Fiquei esperando, esperando… Já estava parado fazia quatro meses, muito acima do peso. Foi quando recebi um convite do São Gonçalo, de um antigo treinador, e as coisas começaram a andar novamente. Fui do jeito que deu”, explica.

Edu ainda jogou pelo Atlético Tubarão-SC antes da segunda passagem pelo Brusque, em 2020, um marco para a mudança na carreira.

Desacreditado no início, despediu-se do Brusque como um ídolo, com direito a uma atuação memorável diante do Remo. Marcou um gol e ainda defendeu um pênalti como goleiro improvisado nos minutos finais de partida.

“Não trocaria nenhuma rua em que entrei neste percurso, por mais que tenha traçado um trajeto mais longo e difícil. Tenho muito o que agradecer ao Brusque, é um amor recíproco. Espero viver isso no Cruzeiro também”, diz.

O sonho de jogar no Cruzeiro esteve em xeque quando a agremiação adotou o modelo clube-empresa, a SAF (Sociedade Anônima do Futebol), comprada pelo ex-jogador Ronaldo.

Logo em suas primeiras ações, o grupo de trabalho estabelecido pelo ex-atacante reviu contratos classificados como “impagáveis e irresponsáveis”. Contratações como a do goleiro Jailson, a do lateral direito Pará e a do zagueiro Maicon foram desfeitas.

“Quando acertamos, foi diretamente com o Alexandre Mattos [agora ex-diretor de futebol do clube] e com o Vanderlei Luxemburgo [ex-técnico]. Ficou uma tensão sobre quais contratos seguiriam, mas pessoas ligadas ao Ronaldo garantiram que a minha situação seria mantida normalmente”, conta.

Bancado pelo Fenômeno, ganhou do ídolo histórico, que tem diferentes tipos de superação em sua trajetória, a chance de ser o centroavante. Correspondeu com um ótimo início: seis gols em nove jogos disputados -a última dessas partidas, o clássico contra o Atlético-MG, foi interrompida de forma inesperada, após choque de cabeça com o goleiro rival Everson.

As conversas com Ronaldo até aqui foram rápidas e não envolveram dicas sobre posicionamento ou coisas típicas da posição. Mesmo assim, ele conta que o agora gestor frequentemente pergunta se há melhorias no dia a dia a serem feitas.

Cruzeiro e Edu estão unidos por algo em comum: a obsessão pela Série A e a superação. O clube mineiro está afastado desde 2020 da elite do futebol nacional, e Edu jamais jogou a principal competição do país. Seu contrato vai até o final de 2024.

“O objetivo é o acesso da Série A. Não abrimos mão do Mineiro e da Copa do Brasil, mas a meta é subir. Conquistando esse acesso, vamos marcar o nosso nome na história por recolocar o clube em seu lugar. Eu nunca joguei na elite, mas, se cheguei até aqui, tenho certeza de que a minha hora vai chegar. E a do Cruzeiro, também”, conclui.