• Joe Tidy
  • Repórter de segurança cibernética

20 março 2022

Um membro do grupo de hackers Squad 303/Anonymous com rosto escondido

Um membro do grupo de hackers Squad 303/Anonymous

O coletivo de hackers e ciberativistas Anonymous vem bombardeando a Rússia com ataques cibernéticos desde que declarou “guerra cibernética” ao presidente Vladimir Putin em retaliação à invasão da Ucrânia.

Várias pessoas que operam sob essa bandeira conversaram com a reportagem da BBC sobre suas motivações, táticas e planos.

De todos os ataques cibernéticos realizados desde o início do conflito na Ucrânia, destaca-se uma ação do Anonymous em redes de TV russas.

O ataque foi capturado em um pequeno vídeo que mostra a programação normal interrompida com imagens de bombas explodindo na Ucrânia e soldados falando sobre os horrores do conflito.

O vídeo começou a circular em 26 de fevereiro e foi compartilhado por contas de mídia social do Anonymous com milhões de seguidores. Uma postagem no Twitter trazia uma mensagem que, traduzida, fica desta forma: “Canais de TV estatais #russos foram hackeados pelo #Anonymous para transmitir a verdade sobre o que acontece na #Ucrânia”.

Ela rapidamente acumulou milhões de visualizações.

Imagem da destruição da guerra na TV

O vídeo foi enviado para uma mulher nos EUA, Eliza, por seu pai na Rússia

O caso tem todas as características de uma ação do Anonymous – dramática, impactante e fácil de ser compartilhada online. Como muitos outros ataques cibernéticos do grupo, também foi extremamente difícil de verificar.

Mas um dos grupos menores de hackers do Anonymous disse que eles eram os responsáveis ​​e que assumiram os serviços de TV por 12 minutos.

A primeira pessoa a postar o vídeo também foi capaz de verificar se era real. Eliza mora nos Estados Unidos, mas seu pai é russo e ligou para ela quando seus programas de TV foram interrompidos. “Meu pai me ligou quando aconteceu e disse: ‘Oh meu Deus, eles estão mostrando a verdade!’ Então eu consegui que ele gravasse e postei o vídeo online. Ele diz que um de seus amigos viu isso acontecer também.”

A Rostelecom, empresa russa que administra os serviços hackeados, não respondeu aos pedidos de comentários da reportagem.

Os hackers justificaram suas ações dizendo que ucranianos inocentes estavam sendo massacrados. “Vamos intensificar os ataques ao Kremlin, se nada for feito para restaurar a paz na Ucrânia”, acrescentaram.

O Anonymous diz que também derrubou sites russos e roubou dados do governo, mas Lisa Forte, sócia da empresa de segurança cibernética Red Goat, diz que a maioria desses ataques até agora tem sido “bastante básica”.

Os hackers têm usado principalmente ataques DDoS, onde um servidor é sobrecarregado por uma enxurrada de solicitações, explicou ela. Estes são relativamente simples de realizar e apenas colocam os sites offline temporariamente.

“Mas o ataque cibernético da TV é incrivelmente criativo”, disse ela, “e acredito que muito difícil de realizar”.

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Quem é o Anonymous?

  • O coletivo de hackers e ciberativistas (ou ‘hacktivistas’) surgiu em 2003 a partir do site 4chan
  • O grupo não tem liderança, seu slogan é “somos legião”
  • Qualquer um pode reivindicar ser parte do grupo e hackear por qualquer causa que quiser, mas geralmente atacam organizações acusadas de uso indevido de poder
  • Seu símbolo é uma máscara de Guy Fawkes, que ficou famosa pelos quadrinhos V de Vingança, de Alan Moore, na qual um revolucionário anarquista derruba um governo fascista corrupto.
  • O grupo tem muitas contas de mídia social, com 15,5 milhões de seguidores apenas em suas páginas do Twitter
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Hackers anônimos também desfiguraram sites russos. Lisa Forte diz que isso envolve ganhar o controle de um site para alterar o conteúdo exibido.

Até agora, os ataques causaram perturbações e constrangimentos, mas os especialistas cibernéticos estão cada vez mais preocupados com a explosão do ativismo cibernético desde a invasão.

Eles estão preocupados que um hacker possa acidentalmente derrubar a rede de computadores de um hospital ou interromper links de comunicação essenciais, por exemplo.

“Nunca vi nada assim”, diz Emily Taylor, do Cyber ​​Policy Journal. “Esses ataques trazem riscos. [Eles] podem levar a uma escalada, ou alguém pode acidentalmente causar danos reais a uma parte fundamental da vida civil”.

O coletivo Anonymous não era tão ativo há anos.

Roman, um empresário de tecnologia ucraniano que lidera um grupo de hackers chamado Stand for Ukraine (Defenda a Ucrânia, em tradução livre), não tinha ligações com a organização até que a Rússia invadiu seu país.

Mas ele me disse que quando ele e sua equipe desfiguraram brevemente o site da agência de notícias estatal russa Tass, com um pôster anti-Putin, eles incluíram um logotipo do Anonymous.

Roman trabalha em seu apartamento no sexto andar em Kiev, coordenando sua equipe enquanto eles criam sites, aplicativos Android e bots do Telegram para ajudar no esforço de guerra da Ucrânia e hackear alvos russos.

Roman, com o rosto propositalmente borrado, trabalhando em seu apartamento no sexto andar

Crédito, Roman

Roman no trabalho: “Às vezes vejo foguetes no céu”

“Estou pronto para pegar um rifle pela Ucrânia, mas no momento minhas habilidades são melhor usadas no computador. Então estou aqui em minha casa com meus dois laptops, coordenando essa resistência de TI.”

Ele diz que seu grupo desativou um serviço de passagens de trem regional russo por várias horas, embora a BBC não tenha conseguido verificar essa informação.

Ele defende suas ações dizendo: “Essas coisas são ilegais e erradas até que haja uma ameaça para você ou seu parente”.

Outro grupo que se fundiu com o Anonymous é uma equipe polonesa de hackers chamada Squad 303, em homenagem a um famoso esquadrão de caças poloneses na Segunda Guerra Mundial.

“Trabalhamos junto com o Anonymous o tempo todo e agora me considero um membro do movimento Anonymous”, diz um membro do grupo, que usa o nome do piloto da Segunda Guerra Jan Zumbach como apelido.

Ele pediu que sua foto não fosse publicada. Outro membro de sua equipe, um ucraniano, enviou uma foto dele mesmo de capacete e máscara. Ele descreveu sua situação como “na barricada com um rifle durante o dia e hackeando com o Squad/Anonymous à noite”.

O Squad 303 construiu um site que permite ao público enviar mensagens de texto para números de telefone russos aleatórios, contando a verdade sobre a guerra. Eles afirmam ter possibilitado o envio de mais de 20 milhões de mensagens SMS e WhatsApp.

Dois grupos do Anonymous com quem conversei citaram isso como a coisa mais impactante que o coletivo fez até agora pela Ucrânia.

Questionado sobre como justificou a atividade ilegal do Squad, Jan Zumbach disse que eles não roubaram ou compartilharam nenhuma informação privada e estavam apenas tentando falar com os russos, com o objetivo de vencer a guerra de informações.

No entanto, ele também disse que eles estavam planejando um ataque hacker mais impactante nos próximos dias.

Grupos semelhantes na Rússia também estão realizando ataques cibernéticos contra a Ucrânia, mas aparentemente em menor escala.

Houve três grandes ondas de ataques DDoS coordenados contra a Ucrânia desde janeiro, além de três incidentes de ataques “wiper” mais sérios que excluíram dados em um pequeno número de sistemas de computador ucranianos.

Na quarta-feira (16/3), um vídeo manipulado do presidente ucraniano apareceu no site do canal de TV Ucrânia 24 após uma aparente invasão.

No ambiente atual, porém, é difícil saber exatamente quem está por trás de qualquer ataque cibernético.

“O calcanhar de Aquiles do Anonymous é que qualquer um pode se dizer Anonymous, incluindo atores estatais que operam contra aquilo pelo qual lutamos”, diz o antigo hacker do Anonymous Anon2World.

“Com nosso atual aumento de popularidade, é (quase) certo que haverá repercussões óbvias de uma entidade governamental. Quanto a aumentar o caos, estamos acostumados ao caos, especialmente online.”

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Fonte: BBC